Há que saber separar propaganda da realidade. Nós estamos num eixo cultural completamente dominado pela cultura americana e europeia.
Existe, desde logo, uma intenção clara de nos fazerem acreditar que determinados países são inimigos naturais e ameaças. E, consequentemente, as máquinas de propaganda pegam em aspetos reais, evidenciam-nos e exageram-nos para nos fazer acreditar que o país X, o país, Y ou o país Z, são aquilo e pouco mais.
O regime Iraniano tem evidentes problemas associados aos direitos das mulheres, das minorias LGBT ou restrições à liberdade da imprensa e censura. No entanto, não é essa tralha obscurantista que querem fazer parecer. Há países islâmicos com excelentes relações com os EUA que são bastante mais obscurantistas.
Posso falar com alguma propriedade pois já estive 2 vezes no Irão em trabalho. É um país que apesar das diversas sanções de que são alvo têm, por exemplo, um notável setor tecnológico, com progressos muito consideráveis em áreas como as energias renováveis, a biotecnologia, a nanotecnologia ou a inteligência artificial. E não apenas uma indústria virada o setor militar e a produção de mísseis e drones. São um país que têm acolhido milhões de refugiados das guerras e conflitos que desestabilizaram todo o médio oriente nas últimas décadas, só do Afeganistão são uns bons milhões. Têm ensino público de qualidade e boas universidades.
Há questões que são mais complexas do que aquilo que parecem. Vocês se passearem por Teerão pouca diferença vão notar para a vida nas nossas cidades. As pessoas vestem-se como aqui, as mulheres não andam todas tapadas, arranjam-se, andam maquilhadas, vão ao cabeleireiro, pintam as unhas, frequentam universidades. Têm mais restrições que os homens e por vezes sofrem abusos, mas as mulheres e a sociedade iraniana têm lutado por mais direitos e têm feito progressos. Como as nossas sociedades fizeram no passado. Cabe aos Iranianos lutar por esse progresso, não cabe a pessoas a milhares de km de distância que nem sequer sabem onde fica o Irão no mapa ou muito menos nomear duas cidades iranianas.
Por cá também se romantiza sobre uma ideia fictícia de um Irão antes da revolução islâmica. O regime de Reza Pahlavi era um regime monárquico absolutista. Havia censura, não havia liberdade de imprensa, as pessoas eram perseguidas e torturadas se tivessem ideias dissidentes. Muito poucas mulheres tinham uma educação escolar, só aquelas que pertencessem às elites ou a famílias com mais posses, normalmente ligadas ao regime. Era um país com assimetrias e desigualdades económicas muito grandes. Portanto, o Irão não passou do Iluminismo para a Idade das Trevas. Muitas coisas melhoraram e outras pioraram. Sobretudo, a grande diferença é que antes da revolução islâmica era um país sem soberania, governado por um monarca que não passava de uma marioneta dos americanos, que tinham interesse no Irão fundamentalmente para que as grandes corporações petrolíferas americanas e britânicas tivessem acesso ao petróleo iraniano e cerca de metade dos lucros, além de total controlo sobre a produção e preços.
Além de que não são os americanos, nem os europeus e muito menos os israelitas que estão interessados no bem do povo iraniano. Estão apenas interessados nas suas próprias agendas e nos seus próprios interesses. Os processos de progresso das sociedades devem ser orgânicos e não fruto de ações externas por interesses externos.