Ao ver pessoas no meu redor cujo sei quanto a vida é difícil votar Chega comecei a pensar no que os alemãs chaman Schadenfreude (a activação de circuitos ligados a recompensa quando o nosso rival tropeça). Uma pessoa é capaz de fazer escolhas deletérias para os seus próprios instintos se ela tem a garantia que as suas escolhas irão prejudicar os seus inimigos, a neurociência mostrou isso muito bem. E é aqui que se encontra "o elefante ao meio da sala", que nos dá uma chave para compreender a motivação das pessoas que votam por partidos como o Chega: partidos que não defendem concretamente os interesses dessas pessoas mas que prosseguem políticas contras grupos que essas mesmas pessoas vão considerar como "oponentes", quite ir contra os seus proprios interesses.
Mesmo sentindo-se do lado dos economicamente "dominados", para essas pessoas ainda lhe restam, do ponto de vista "étnico", um sentimento de pertencimento a uma classe "dominante" e é aí que vai começar a nascer um sentimento de ameaça, e pouco a pouco vão aparecer e adicionando-se ideias racistas.
A precariedade social não pode ser a única grelha de leitura do voto "extrema direita", o voto Chega não pode ser considerado só como um vote de classe, ocultando considerações identitárias.
Não existe uma única e simple reposta que explica porquê as pessoas votam contras os seus proprios interesses mas o racismo dever ser considerado como um facto sério, grave, social, que pode explicar em parte essas escolhas.
Como diz a poetisa Douce Dibondo: "enquanto não consideramos a raça como um paradigma, um fator social total, cairemos nas mesmas cegueiras quanto ao funcionamento dos dominantes cujo o interesse cabe na divisão e no um contra o outro".