Vimos isso contra o Casa Pia e Famalicão em que não jogámos, desculpem a expressão, a ponta de um corno e já havia pessoal entusiasmado.
Gostava de saber a tua opinião sobre o líbero já agora, achas que o problema é do jogador que ocupa a posição ou da função em si?
Obrigado.
Concordo plenamente contigo, especialmente nessa parte do entusiasmo precoce.
Contra o Casa Pia e o Famalicão jogámos pouco. Zero organização, zero ideias, zero domínio.
Mas bastaram três passes seguidos no meio-campo e o placebo Mora para se ouvir “ah, agora sim, vê-se a ideia”.
Vê-se pouco. E joga-se ainda menos.
Quanto ao líbero, a questão não é só quem está lá — é a função em si no contexto atual do FC Porto.
O líbero clássico era o homem da sobra, que jogava atrás dos centrais.
Beckenbauer, Scirea, Hierro — todos grandes nomes. Mas isso foi num futebol que já não existe.
Hoje, o que se pede a um jogador naquela zona do campo é leitura defensiva, velocidade de reação, qualidade no passe e capacidade de fechar as transições.
Ou seja, se queres jogar com esse “central mais livre”, precisas de uma equipa bem coordenada, com cobertura garantida e jogadores rápidos nas dobras.
No futebol moderno, quando há algo vagamente semelhante a um líbero, é em saída a três com um médio recuado entre centrais (como fazia o Busquets ou Rodri), mas nunca desprotegendo o centro da defesa.
Eustáquio não é líbero — nem tem perfil para isso.
É um médio de contenção, com qualidade na pressão, mas que não tem velocidade, jogo aéreo ou leitura para cobrir metros atrás dos centrais.
Aliás, ele próprio perde-se em campo porque não sabe ocupar o espaço entre os dois centrais quando a equipa perde a bola.
Está constantemente atrasado na reação, fora do timing de cobertura ou sem linha de passe para iniciar a construção.
Mas mesmo que tivesses um craque naquela posição — o problema maior é estrutural.
A função está mal protegida taticamente.
Quando o “líbero” sobe, como pede o modelo do Anselmi, não há compensação real dos médios nem dos laterais.
Resultado? Uma avenida no meio sempre que perdemos a bola, ainda por cima com uma linha defensiva alta e dois centrais abertos.
Qualquer equipa com dois jogadores rápidos mete-nos em apuros — e temos visto isso todas as semanas.
O contexto do Tugão amplifica os erros.
A maioria das equipas joga contra o FC Porto fechada, com bloco baixo e saída rápida em contra-ataque.
Ou seja, esperam o erro — e atacam logo o espaço que deixamos nas costas.
Não há tempo para reorganizar. Não há perdão.
O modelo do líbero transforma o FC Porto numa equipa previsível e suicida sem bola
Portanto, é os dois: o jogador não tem perfil — e a função, neste modelo, simplesmente não funciona com este plantel.
E um bom treinador vê isso a tempo. Corrige. Ajusta.
Anselmi viu... e decidiu continuar.
E isso, para mim, diz tudo.
Sim, é verdade que o Anselmi já usava o sistema com líbero.
Mas uma coisa é usá-lo na América do Sul ou no México, onde o ritmo de jogo é mais pausado, a pressão adversária é menos coordenada e há muito mais espaço para construir com bola.
Outra coisa completamente diferente é trazê-lo para o futebol europeu, e ainda por cima para o FC Porto, num campeonato como o português, onde os adversários jogam todos com as linhas muito baixas, compactas e apostam no contra-ataque.
O Anselmi, para mim, está a tentar encaixar uma peça quadrada num buraco redondo.
A ideia até pode ser interessante em teoria ou em contextos específicos.
Mas aqui e agora, no FC Porto, com o plantel atual e num campeonato como o português, esta aposta no líbero está a ser um desastre.
E quando o jogador escolhido é Eustáquio, o erro passa de conceptual para grotesco.
Não é o jogador certo. Não é o contexto certo. Não é o momento certo.
E um treinador que não percebe isso, ou não lê o jogo — ou está agarrado à teimosia.