Ontem foi o dia da resistência romani, uma referência à forma como um grupo de ciganos num campo de concentração resistiu aos nazis e à sua própria morte já quase no final da guerra. O genocídio de ciganos pelo regime nazi e seus aliados é pouco falado, mas é certamente o mais próximo que tivemos de um genocídio literal já que no holocausto terão sido assassinados cerca de metade de todos os ciganos da Europa na altura. Um horror sob qualquer ângulo.
Dizem-me cada vez que defendo os ciganos dos ataques políticos que vão recebendo que não se pode rejeitar que existem problemas de integração. E não, não rejeito que haja problemas. A população cigana está sobre-representada na população prisional e nos beneficiários de RSI, há problemas de casamentos e abandono escolar precoces. Alguns destes problemas são comuns a pessoas com as mesmas condições económicas, outros serão fruto da exclusão e da discriminação dirigida especificamente a ciganos, e uma parte será cultural. Mas não será certamente pelo permanente apontar de dedo, pelo acicatar de ódios racistas para benefícios eleitorais que o problema se irá resolver. Essa estratégia pode ajudar a conquistar uns pontitos nas sondagens, mas é a forma mais miserável e imoral de os conquistar porque é à custa de instigar o ódio. Ódio que nunca se sabe até onde poderá levar. Acima de tudo, ao contrário do que argumenta para se desculpar esta estratégia, não funciona para resolver os tais problemas.
Como é que eu sei que essa estratégia de apontar o dedo e instigar o ódio não resolve nada? Porque não há nada de novo nisso nem se está a fazer aqui pela primeira vez. É feito há muitos anos em alguns países na Europa de Leste, onde, após anos deste discurso, o ódio aos ciganos é algo generalizado mesmo entre “moderados”. Na Bulgária, Roménia, Hungria ou Eslováquia existem há anos movimentos organizados que se dedicam a denunciar crimes cometidos por ciganos, a persegui-los e a encharcar a opinião pública com todas as notícias negativas que encontram. O resultado não foi mais inclusão, foi ainda mais exclusão e ainda mais problemas. A estratégia de instigação do ódio serviu para alguns políticos populistas ganharem o poder que desejavam (na Bulgária um vice-primeiro ministro de direita radical foi condenado por discurso de ódio em relação a ciganos e outro dirigente do seu partido sugeriu a eutanásia de ciganos), mas não fez nada para resolver o problema, antes pelo contrário. Tornou-se comum nessa zona da europa ataques indiscriminados, incendiarem-se aldeias e acampamentos ciganos.
Há uns anos quando vivi na Hungria, decidi fazer umas férias no hemisfério sul durante o inverno. Regressei com um bronzeado fora de época que fez com que fosse facilmente confundido com um cigano. Até passar o bronzeado, foram umas semanas de insultos na rua e de receio de andar em certas zonas de Budapeste à noite. Os ciganos naquela zona do mundo vivem com isso a vida toda. Uma vivência que apenas intensifica a exclusão e os problemas daí decorrentes.
Promover o ódio e a discriminação não ajuda a acabar com a exclusão. Isso devia ser óbvio, mas para quem não for, temos os exemplos da Europa de Leste uns anos à frente nesse discurso para o demonstrar. Numa altura em que se fala tanto de antissemitismo, não podemos esquecer as duas lições dos anos 20 e 30 do século passado:
1) o ódio não aparece de um dia para o outro, constrói-se pela pena de políticos oportunistas e moderados coniventes.
2) Uma vez lançado, o ódio cria exclusão que cria ainda mais ódio e não se sabe onde este ciclo pode parar.
A solução não passa por apontar permanentemente os exemplos negativos para instigar ódio e exclusão, mas apontar os exemplos positivos de inclusão que felizmente existem em abundância. Apontar o caminho da inclusão em vez de incentivar o ódio e a exclusão, pode ser eleitoralmente um fracasso, mas é a única possibilidade de evolução lenta para uma solução.
A minha principal luta política é pelo desenvolvimento económico do país e sei bem quais são os meus adversários nessa luta. Mas também sei que aquilo que ficou para a história dos anos 30 do século XX não foi o crescimento do PIB. Convinha de vez em quando lembrarmo-nos disto, saber em que plataformas de valores estamos assentes para nos podermos focar em tudo o resto sem distrações.
Descubram quem foi o “facho” que escreveu isto.
Gostava que o prezado user Philipp tentasse adivinhar.
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