H
hast
Guest
Natural de Split (Croácia) 30 de Junho de 1933
Fora apenas um jogador mediano no Hajduk Split. Para além de jogar futebol, trabalhava como mecânico. Fazia, então, vários quilómetros a pé, de casa para o trabalho, do trabalho para o treino. «Comecei por ser ponta-esquerda, acabei como médio, não fui um jogador de sonho como muitos que eu fiz, fui mediano, igual a tantos outros que, agora, fazem fortuna no futebol, mas eu fui sempre amador, nem um cêntimo recebi de vencimento por jogar à bola. Nunca me importei com isso porque o futebol era uma paixão e, por essa altura, já descobrira que as paixões mais arrebatantes eram as que nada tinham de interesseiro.»
Quando, aos 34 anos, Tomislav Ivic fechou a carreira de futebolista, sentiu, em si, sobretudo, o vazio sentimental. Emotivo, pediu à mulher com quem se casara dois anos antes, que lhe desse oportunidade de ser feliz, de não gastar uma vida inteira agarrado a uma banca de mecânico. Deu. Desempregou-se da oficina e inscreveu-se, em Belgrado, bem longe de Split, num curso de treinador de futebol, que terminaria, ao fim de... um ano, com distinção. Durante esse tempo foi sobrevivendo alimentando-se de sandes, enquanto, em Split, a mulher trabalhava, madrugada dentro, como costureira. «Fez muitos sacrifícios por mim, quando acabei o curso disse-lhe que passaria a preocupar-se apenas com a casa e com os filhos, que dinheiro ganharia eu como treinador. Foi assim que me transformei num... zíngaro, num cigano, como vocês dizem em Portugal, cirandando de país em país, mas por uma boa causa, por causa do futebol, que continuando a ser paixão, passou a ser, também, profissão, pelo que, naturalmente, exigi que me pagassem pelo meu devido valor.»
Foi como responsável pelo futebol juvenil do Hajduk que se lançou como treinador. Cinco anos assim andou, até que o chamaram a treinador principal. Deslumbrou. Conquistou dois títulos nacionais, em 1974 e 1975 e três Taças da Jugoslávia, em 1973, 1974 e 1976. A sua fama galgou as fronteiras da Jugoslávia, que era então um mosaico de nacionalidades cimentado por um homem só, Tito de seu nome, mas que, com a sua morte, haveria de dar no que deu tragicamente.
Por isso, em 1977, Tomislav Ivic transferiu-se para o Ajax, tornando-se, logo na primeira época, campeão da Holanda, descobrindo pérolas como Piet Schrijvers, Ruud Krol, Soren Lerby e Frank Arnesen. Um ano depois, regressaria ao Hajduk Split, para ser, mais uma vez, campeão da Jugoslávia, porque o presidente do Ajax se recusou a pagar-lhe parte do ordenado... «por debaixo da mesa».
Em 1980, Ivic assumiu o comando do Anderlecht, campeão se sagrou, era o seu destino, no ano seguinte queixou-se, «roubaram-nos o segundo título consecutivo», adiantando: «Foi aquela história que envolveu o Standard de Liège, o treinador Raymond Goethals e vários jogadores famosos que foram comprados e, depois, punidos severamente pela justiça do futebol belga.» Entrou, então, em travessia de deserto, quase um ano no desemprego, enfim um aceno da Turquia, a promessa de um ordenado anual de nove mil contos no Galatasaray, onde Ivic estava quando, em meados de 1984, foi indicado como sucessor de Eriksson no comando técnico do Benfica. Na Luz estaria escassas duas semanas, dando o dito por não dito, porque, ao que parece, o Benfica se recusou a pagar-lhe em... dólares.
Ganhar tudo nas Antas escorraçando Gomes
Partiu para Itália, para treinador do Avelino, pela primeira vez na sua carreira sentiu o sabor amargo do fracasso, foi para a Grécia, para o Panathinaikos, onde Pinto da Costa o desencantou para, em 1987, substituir Artur Jorge. Um ano esteve nas Antas, tudo ganhando, menos a Taça dos Campeões Europeus. Para além da conquista da Taça Intercontinental, da Supertaça Europeia, da Taça de Portugal, da Supertaça Cândido de Oliveira, o F. C. Porto de Ivic sagrou-se campeão nacional, com 15 pontos de avanço sobre o Benfica! Quando das Antas saiu, para além de ter assumido que decidira afastar Fernando Gomes da equipa porque era... finito, disse, à despedida, que os portistas ainda haveriam de chorar muito por si...
Partiu e continuou a brilhar no Paris Saint-Germain e no Atlético Madrid de Paulo Futre, e, em Maio de 1990, quando dele se falou para treinador do... Sporting, através de A BOLA enviou recado que dissuadia leoninos sonhos: «Tenho 25 anos de treinador, são 25 anos de Vietname, tenho é de começar a pensar em descansar.» Dois anos depois, contudo, como se adiasse um pouco mais a sabatina, para melhor compor o ramalhete dos clubes onde escrevera história a letras de ouro, aceitou convite para treinar o... Benfica. Não seria muito feliz. Antes pelo contrário. Sem que cinco meses se passassem, chicoteado, foi mágoa que nunca antes sentira como treinador, por a sua equipa estar já a 10 pontos do F. C. Porto na corrida para o título!
Retornou a Split, para viver, arabicamente, dos rendimentos, na mansão que construiu com os dinheiros do futebol numa das ilhas mais paradisíacas da Dalmácia. E foi de lá que disse que ao Benfica faltava, sobretudo, uma «liderança forte, um presidente como Pinto da Costa». Dois meses depois do desabafo, em Maio de 1993, Tomislav era, de novo, contratado para regressar às Antas, em substituição de Carlos Alberto Silva.
Despedida das Antas para «não morrer no banco»
Tomislav Ivic deixara, refulgente, a aura de campeão a pairar pelas Antas. Brilharia, ainda, cinco anos passados sobre a saga fabulosa de 1987/88, cintilante, a sua estrela? Era a dúvida. Pinto da Costa, temerário, aceitou correr o risco, mas depressa se veria que o fascínio do croata se evolara já, apesar de ainda ter conseguido colocar o F. C. Porto na fase final da Liga dos Campeões, eliminando o Feyenoord. No Campeonato, em cada jornada que passava, mais o F. C. Porto hipotecava ambições, pelo que se esperava que a cabeça de Ivic rolasse de um momento para o outro. Mas Pinto da Costa foi sustendo Ivic, até que, já em Janeiro de 1994, após vitória concludente em Aveiro, anunciou que Ivic se... despedira (?!), seduzido pelo convite que recebera para organizar, no âmbito da FIFA, o futebol na Croácia, asseverando que era com pena que o F. C. Porto o libertava.
Tomislav, à despedida, diria: «Fisicamente ainda tenho condições para continuar a trabalhar. Há muitos treinadores que são mais velhos que eu, mas não queria morrer no banco! Esta é a melhor hora para acabar como treinador, não preciso de morrer como treinador, quero morrer como toda a gente. O futebol, para mim, é como um santo e, no fundo, não vou deixá-lo... O stress do banco é muito difícil para um treinador. Quando se ganha, está tudo bem, mas quando se perde, fica-se triste, doente, e é difícil recuperar. Estou cansado, porque o futebol está diferente, já não é como antigamente. Em determinada altura, o treinador era a personagem número um do clube, depois passou a ser o jogador e agora é o presidente! Neste momento, o treinador já nem aparece em terceiro, mas sim em 10.º plano. Muitas vezes já só serve para cobrir os erros do clube, não serve para nada. Se me sinto um pouco frustrado por terminar uma carreira de sucesso a meio de uma temporada, sem qualquer título, depois de já não ter sido muito feliz nas cinco épocas anteriores, de tal modo que, no Benfica, pouco antes sofrera a minha primeira chicotada? São situações que nada têm a ver uma com a outra. Esta minha saída do F. C. Porto não se deveu, sequer, a chicotada. Mas, mais importante que os títulos conquistados, um pouco por toda a Europa, foram os jogadores que ajudei a formar. E formei muitos. Esse é o meu orgulho. Muitos deles tratam-me como um pai. Inclusivamente, há famílias de alguns deles que vão à Igreja rezar por mim! Essa é a minha maior satisfação.» Para Split partiu, então. Para viver, enfim, faraonicamente, dos rendimentos que acumulou.
Fora apenas um jogador mediano no Hajduk Split. Para além de jogar futebol, trabalhava como mecânico. Fazia, então, vários quilómetros a pé, de casa para o trabalho, do trabalho para o treino. «Comecei por ser ponta-esquerda, acabei como médio, não fui um jogador de sonho como muitos que eu fiz, fui mediano, igual a tantos outros que, agora, fazem fortuna no futebol, mas eu fui sempre amador, nem um cêntimo recebi de vencimento por jogar à bola. Nunca me importei com isso porque o futebol era uma paixão e, por essa altura, já descobrira que as paixões mais arrebatantes eram as que nada tinham de interesseiro.»
Quando, aos 34 anos, Tomislav Ivic fechou a carreira de futebolista, sentiu, em si, sobretudo, o vazio sentimental. Emotivo, pediu à mulher com quem se casara dois anos antes, que lhe desse oportunidade de ser feliz, de não gastar uma vida inteira agarrado a uma banca de mecânico. Deu. Desempregou-se da oficina e inscreveu-se, em Belgrado, bem longe de Split, num curso de treinador de futebol, que terminaria, ao fim de... um ano, com distinção. Durante esse tempo foi sobrevivendo alimentando-se de sandes, enquanto, em Split, a mulher trabalhava, madrugada dentro, como costureira. «Fez muitos sacrifícios por mim, quando acabei o curso disse-lhe que passaria a preocupar-se apenas com a casa e com os filhos, que dinheiro ganharia eu como treinador. Foi assim que me transformei num... zíngaro, num cigano, como vocês dizem em Portugal, cirandando de país em país, mas por uma boa causa, por causa do futebol, que continuando a ser paixão, passou a ser, também, profissão, pelo que, naturalmente, exigi que me pagassem pelo meu devido valor.»
Foi como responsável pelo futebol juvenil do Hajduk que se lançou como treinador. Cinco anos assim andou, até que o chamaram a treinador principal. Deslumbrou. Conquistou dois títulos nacionais, em 1974 e 1975 e três Taças da Jugoslávia, em 1973, 1974 e 1976. A sua fama galgou as fronteiras da Jugoslávia, que era então um mosaico de nacionalidades cimentado por um homem só, Tito de seu nome, mas que, com a sua morte, haveria de dar no que deu tragicamente.
Por isso, em 1977, Tomislav Ivic transferiu-se para o Ajax, tornando-se, logo na primeira época, campeão da Holanda, descobrindo pérolas como Piet Schrijvers, Ruud Krol, Soren Lerby e Frank Arnesen. Um ano depois, regressaria ao Hajduk Split, para ser, mais uma vez, campeão da Jugoslávia, porque o presidente do Ajax se recusou a pagar-lhe parte do ordenado... «por debaixo da mesa».
Em 1980, Ivic assumiu o comando do Anderlecht, campeão se sagrou, era o seu destino, no ano seguinte queixou-se, «roubaram-nos o segundo título consecutivo», adiantando: «Foi aquela história que envolveu o Standard de Liège, o treinador Raymond Goethals e vários jogadores famosos que foram comprados e, depois, punidos severamente pela justiça do futebol belga.» Entrou, então, em travessia de deserto, quase um ano no desemprego, enfim um aceno da Turquia, a promessa de um ordenado anual de nove mil contos no Galatasaray, onde Ivic estava quando, em meados de 1984, foi indicado como sucessor de Eriksson no comando técnico do Benfica. Na Luz estaria escassas duas semanas, dando o dito por não dito, porque, ao que parece, o Benfica se recusou a pagar-lhe em... dólares.
Ganhar tudo nas Antas escorraçando Gomes
Partiu para Itália, para treinador do Avelino, pela primeira vez na sua carreira sentiu o sabor amargo do fracasso, foi para a Grécia, para o Panathinaikos, onde Pinto da Costa o desencantou para, em 1987, substituir Artur Jorge. Um ano esteve nas Antas, tudo ganhando, menos a Taça dos Campeões Europeus. Para além da conquista da Taça Intercontinental, da Supertaça Europeia, da Taça de Portugal, da Supertaça Cândido de Oliveira, o F. C. Porto de Ivic sagrou-se campeão nacional, com 15 pontos de avanço sobre o Benfica! Quando das Antas saiu, para além de ter assumido que decidira afastar Fernando Gomes da equipa porque era... finito, disse, à despedida, que os portistas ainda haveriam de chorar muito por si...
Partiu e continuou a brilhar no Paris Saint-Germain e no Atlético Madrid de Paulo Futre, e, em Maio de 1990, quando dele se falou para treinador do... Sporting, através de A BOLA enviou recado que dissuadia leoninos sonhos: «Tenho 25 anos de treinador, são 25 anos de Vietname, tenho é de começar a pensar em descansar.» Dois anos depois, contudo, como se adiasse um pouco mais a sabatina, para melhor compor o ramalhete dos clubes onde escrevera história a letras de ouro, aceitou convite para treinar o... Benfica. Não seria muito feliz. Antes pelo contrário. Sem que cinco meses se passassem, chicoteado, foi mágoa que nunca antes sentira como treinador, por a sua equipa estar já a 10 pontos do F. C. Porto na corrida para o título!
Retornou a Split, para viver, arabicamente, dos rendimentos, na mansão que construiu com os dinheiros do futebol numa das ilhas mais paradisíacas da Dalmácia. E foi de lá que disse que ao Benfica faltava, sobretudo, uma «liderança forte, um presidente como Pinto da Costa». Dois meses depois do desabafo, em Maio de 1993, Tomislav era, de novo, contratado para regressar às Antas, em substituição de Carlos Alberto Silva.
Despedida das Antas para «não morrer no banco»
Tomislav Ivic deixara, refulgente, a aura de campeão a pairar pelas Antas. Brilharia, ainda, cinco anos passados sobre a saga fabulosa de 1987/88, cintilante, a sua estrela? Era a dúvida. Pinto da Costa, temerário, aceitou correr o risco, mas depressa se veria que o fascínio do croata se evolara já, apesar de ainda ter conseguido colocar o F. C. Porto na fase final da Liga dos Campeões, eliminando o Feyenoord. No Campeonato, em cada jornada que passava, mais o F. C. Porto hipotecava ambições, pelo que se esperava que a cabeça de Ivic rolasse de um momento para o outro. Mas Pinto da Costa foi sustendo Ivic, até que, já em Janeiro de 1994, após vitória concludente em Aveiro, anunciou que Ivic se... despedira (?!), seduzido pelo convite que recebera para organizar, no âmbito da FIFA, o futebol na Croácia, asseverando que era com pena que o F. C. Porto o libertava.
Tomislav, à despedida, diria: «Fisicamente ainda tenho condições para continuar a trabalhar. Há muitos treinadores que são mais velhos que eu, mas não queria morrer no banco! Esta é a melhor hora para acabar como treinador, não preciso de morrer como treinador, quero morrer como toda a gente. O futebol, para mim, é como um santo e, no fundo, não vou deixá-lo... O stress do banco é muito difícil para um treinador. Quando se ganha, está tudo bem, mas quando se perde, fica-se triste, doente, e é difícil recuperar. Estou cansado, porque o futebol está diferente, já não é como antigamente. Em determinada altura, o treinador era a personagem número um do clube, depois passou a ser o jogador e agora é o presidente! Neste momento, o treinador já nem aparece em terceiro, mas sim em 10.º plano. Muitas vezes já só serve para cobrir os erros do clube, não serve para nada. Se me sinto um pouco frustrado por terminar uma carreira de sucesso a meio de uma temporada, sem qualquer título, depois de já não ter sido muito feliz nas cinco épocas anteriores, de tal modo que, no Benfica, pouco antes sofrera a minha primeira chicotada? São situações que nada têm a ver uma com a outra. Esta minha saída do F. C. Porto não se deveu, sequer, a chicotada. Mas, mais importante que os títulos conquistados, um pouco por toda a Europa, foram os jogadores que ajudei a formar. E formei muitos. Esse é o meu orgulho. Muitos deles tratam-me como um pai. Inclusivamente, há famílias de alguns deles que vão à Igreja rezar por mim! Essa é a minha maior satisfação.» Para Split partiu, então. Para viver, enfim, faraonicamente, dos rendimentos que acumulou.