Não concordo com parte do teu comentário, mas não vale a pena irmos mais fundo senão ficaríamos aqui por horas, não porque não quisesse discutir sobre isto, mas num fórum de futebol e a escrever torna-se cansativo.O apagamento do eu e a instrumentalização da pessoa não é uma percepção, é mesmo uma consequência lógica do comunismo, seja no papel, seja na prática (ver, acerca disso, o meu comentário anterior a este que agora escrevo.
Essa é uma das grandes incoerências de Marx. A (extrema) atenção às desigualdades materiais das pessoas e a indiferença, senão mesmo repulsa, face às diferenças de outro tipo.
Para Marx, abolir o capitalismo seria sempre necessário, ontem ou hoje. Concebia-o como um sistema condenável e condenado, fadado à morte.
"Ah, mas vendo hoje o progresso da social-democracia e de outras correntes derivadas, Marx moderar-se-ia" - não. Já existiam os rebentos na altura e Marx acusava os seus autores de serem cobardes, porquanto rejeitavam a necessidade de uma revolução proletária.
Diga-se, aliás, que o alemão projetava a revolução proletária como sanguinária, não era nada pacífica. E o que se seguia? A ditadura do proletariado, usando e abusando o Estado do seu aparelho coativo para impor os princípios, valores e fins do comunismo.
Marx nunca concretizou como se passaria dessa ditadura do proletariado para a sua utópica sociedade comunista sem classes nem Estado.
Individualidade? Marx condenou certas etnias (judeus), incentivou a perseguição à religião, achava a instituição da família uma aberração (indo beber certas ideias nesse âmbito a Platão), repugnava a liberdade nas suas mais diversas formas e rejeitava interesses próprios dos trabalhadores.
Já agora: és a favor de sociedades de baixo para cima, e eu também sou, mas Marx defendia uma centralização do poder.
Eu não sou Marxista, reconheço muito valor à sua obra e ao seu génio. Estamos a falar de uma pessoa bem à frente do seu tempo, assim como outros da sua época como o próprio Charles Darwin, que desenvolveu a sua teoria sobre a evolução das espécies sensivelmente durante o mesmo período e naturalmente, não acertou em tudo à primeira. Depois de Darwin seguiram-se muitos que foram corrigindo e acrescentando valor à sua elegante teoria. Não podemos olhar para a teoria de Marx como a receita perfeita para o sistema económico e político das sociedades humanas, mas não tenho a menor dúvida que Marx, nos dias de hoje, faria diversas correções e reconheceria erros na sua própria teoria depois de vários terem tentado aplicá-la. Tenho também a certeza que faria críticas brutais ao que foi feito na União Soviética ou na China de Mao. Basta olharmos para o exemplo das religiões, como o Cristianismo, apesar dos ensinamentos e filosofia de Jesus Cristo, muitos subverteram-nos para criar uma estrutura de poder. É uma parte significativa da história das civilizações humanas.
E aproveitando o gancho das religiões, já fui, quando era mais jovem, um ateísta acérrimo. Hoje, à medida com que fui amadurecendo fui percebendo a importância da religião na vida das outras pessoas. Quando amadurecemos começamos a colocar-nos no lugar dos outros. Para mim a religião pode não fazer sentido, mas isso é porque consigo encontrar significado noutras coisas à minha volta. Para outras pessoas, muita gente, a religião ajuda a aliviar as frustrações e o sofrimento inerentes à experiência humana nesta vida. Sim, há o problema dos fundamentalismos e extremismos, mas esses, infelizmente, não são apenas inerentes à religião, além de que apesar uns serem religiosos e outros nãos, o sistemas de pensamento simbólico profundo, são comuns a todos nós e a todas as culturas e civilizações.