Mas acho que é caso para estar alarmado. Mesmo antes do covid-19, eu já estava muito pessimista em relação ao futuro da economia, que desde 2008 só sobrevive ligada à máquina das injecções de liquidez por parte dos bancos centrais. Sem essa injecção de biliões de euros/dólares/libras/ienes /yuans, e a descida das taxas de juros para níveis nunca vistos, o sistema financeiro já teria colapsado há muito. E se é óbvio que essa montanha de dívida nunca iria poder ser paga, não vejo muito bem como é que podemos repetir agora a dose. Que armas restam aos bancos centrais para combater a inevitável recessão? Lançar dinheiro de helicóptero para estimular o consumo? Mas consumo e quarentena são incompatíveis. E por quanto tempo é que o motor da economia pode aguentar esse sobreaquecimento sem gripar de vez?
Outro motivo de pessimismo é a cobardia dos governos, que ainda não perceberam que estamos numa situação de emergência muito pior do que uma III Guerra Mundial, porque pelo menos numa guerra a economia continua a funcionar (nem que seja só a produzir comida e armamento) e que as medidas deviam estar à altura da gravidade dessa emergência. Sem medidas de quarentena radical, o número de infectados em Portugal vai duplicar a cada cinco dias, o que significa que daqui a um mês e meio teremos... 400 000 infectados. Portanto, é evidente que a prioridade tem de ser estancar esta progressão seja lá como for, nem que seja preciso decretar a lei marcial. Fechar tudo excepto hospitais, farmácias e supermercados, impôr o racionamento como em tempo de guerra, porque isto tem de ser encarado como uma guerra.
Podemos não estar perante um cenário apocalíptico, mas tenho a certeza que depois disto nada voltará a ser como dantes. As cadeias de produção, fornecimento e distribuição globais, depois de quebradas, é muito difícil voltar a restaurá-las, porque ninguém expede um navio com mercadorias se não tiver confiança no sistema de pagamentos. O sistema financeiro é o oxigénio da nossa economia. Sem um sistema financeiro operacional, nada circula e portanto nada se produz. Há cem anos um vírus como este mataria muita gente, mas não causaria profundos abalos na economia, porque as economias eram mais fechadas, mais auto-suficientes e portanto mais resilientes. Há cem anos, 70% dos portugueses trabalhavam na agricultura, e portanto de fome não morríamos. Hoje importamos quase tudo, desde as sementes aos fertilizantes, passando pelos medicamentos, etc., etc. Ou seja, estamos muito mais dependentes do que no passado, e é essa interdependência de todas as economias o que torna tudo muito mais frágil e perigoso.
Espero bem estar completamente enganado em relação aos piores cenários. Mas pensar que depois deste esforço de contenção do vírus a economia poderá voltar ao normal de 2019, parece-me completamente ilusório. Infelizmente, acho que entrámos num caminho que não tem retorno, e numa nova fase da história da humanidade.
E como não tenho prazer nenhum em assustar as pessoas, não vou falar mais sobre este assunto. Desejo boa sorte a todos, e que aconteça um milagre qualquer, para que daqui a três meses estejamos todos a rirmo-nos da minha estupidez e alarmismo. Se esse "milagre" acontecer, prometo que altero o meu nick para Dagerman, o Idiota.