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6. Mas enchia a baliza, isso é certo. Tanto assim é que jogou em dois grandes. Como é que foi a aventura no Porto?
Isso já foi uma década depois da do Sporting. Passei então pelo Vitória de Setúbal, depois uma época no Chaves, onde me impus a titular, e seis no Braga, onde cheguei à selecção nacional. Quando dizem que treinador x dá-se bem com jogador y, isso é verdade. O meu caso com António Oliveira é elucidativo e nem o consigo explicar. Eu gostava muito dele, pronto. E eu dava-me bem com ele. Tão simples com isso. Por isso, joguei com ele em Braga e depois na selecção e depois no Porto. São aquelas relações de empatia imediata.
7. Como se proporcionou a transferência para o Porto?
Durante um estágio da selecção nacional, e o meu primeiro ainda foi no tempo do Carlos Queiroz, quando ele dividiu o país em norte e sul para trabalhar com jogadores das duas zonas, um empresário chamado José Veiga disse-me que havia um grande interessado em mim. Perguntei-lhe qual e ele não me adiantou. Só depois é que soube do Porto, embora tenha estado reunido uma vez com o Benfica, através de um senhor chamado Peres Bandeira [responsável, por exemplo, da transferência de Luisão do Cruzeiro para o Benfica em 2003]. Dei preferência ao Porto.
8. E assim foi bicampeão nacional e ganhou uma Taça mais uma Supertaça, não é?
Isso mesmo. Na primeira época, em 97-98, joguei quase sempre num plantel com mais três guarda-redes: o Hilário, o Eriksson e o Taborda. Na segunda, o Porto contratou um jugoslavo chamado Kralj mas as coisas não lhe correram assim tão bem e eu voltei ao onze mas só até Dezembro. Em Janeiro, o Vítor [Baía] veio do Barcelona e passei a suplente. Nessa primeira época, fomos ao Jamor para a final da Taça de Portugal e ganhámos 3-1 ao Braga. Na época seguinte, fomos eliminados pelo Torreense em casa, no dia de Carnaval. Na outra, em 1999-2000, ganhámos a Taça na finalíssima e impedimos a dobradinha do Sporting.
9. Em 2000, já é a ressaca da equipa do penta, com Zahovic, Jardel e Drulovic. Por falar em Jardel, que avançado! Imagino que tenha sido um alívio encontrá-lo mais vezes como companheiro de que como adversário. Ainda assim, deve ter sofrido golos e mais golos dele nos treinos, não?
Ò Rui, a minha mãe costuma dizer-me que nem ela me conhece bem. E porquê? Porque reajo de forma calma aos movimentos mais bruscos à minha volta e sou muito impulsivo em momentos de aparente tranquilidade. Sou assim e pronto. Isso também serve para a minha postura no futebol. Eu gosto do futebol mas gosto tanto do futebol como de estar à mesa com os amigos para almoçar ou jantar. É um dos prazeres da vida. Aprendi desde cedo que o futebol é um, xis ou dois. Não há outro resultado possível. Se perdermos, é muito mau e cabe-nos levantar a cabeça no próximo jogo. E no outro. E no seguinte. E no próximo. Se ganharmos, é muito bom e cabe-nos continuar assim por mais um jogo. Dois, três, quatro e por aí adiante. Se me pergunta se sofri golos do Jardel, e de outros, claro, sim, sofri. E às vezes eles gozavam com os guarda-redes quando era um golo de belo efeito, um chapéu, um calcanhar, uma trivela. Eles gozavam, diziam coisas como 'granda golo', 'toma' e 'vai buscar' só para nos picar e eu reagia sem me mostrar contrariado. Até aplaudia e dizia-lhes 'que g'anda golo, és o maior'. É a minha maneira de ser e de viver o futebol, não há volta a dar.
10. Então os penáltis para si devem ser peanuts?
Eheheheheh, é por aí. Os penáltis são uma treta, é como jogar no Euromilhões. Se um jogador atirar com força e colocação, não é possível defender. Mesmo que adivinhemos o lado da bola e nos estiquemos o máximo, não há hipótese. E se porventura ficarmos quietos e a bola bater em nós, somos considerados uns heróis por isto e aquilo. Não é bem assim. Nem pode. É uma lotaria. Os penáltis são uma lotaria.