Estórias da nossa história

H

hast

Guest
Resultados destes, naquelas alturas, eram considerados normais. O FC Porto pagaria com a mesma moeda uns tempos depois, como se irá ver mais lá para a frente.
Gostaria de ver o que aconteceria se houvesse um «placard» desta envergadura nos dias de hoje, a favor de um ou de outro. A barraca vinha abaixo.:))))
 

fcporto56

Tribuna Presidencial
26 Julho 2006
7,173
0
Sacramento
> Tripeiro Bxl Comentou:

> > hast Comentou:

\"Apesar de ser 5 de Outubro e de haver por todos os lados festas pela República, venderam-se, para o Benfica-F. C. Porto, 773 bilhetes, apurando-se, assim, um benefício de 112$760.\"

773 bilhetes. Não há dúvida que o problema das assistências é bem antigo ;-)

..............................................
Incrivel e que passados quase 100 anos, ha clubes na primeira divisao que nao vendem mais do que isso.
 
H

hast

Guest
Casa nova na Constituição

A construção de uma fábrica obrigou o F.C.Porto a deixar o Campo da Rua da Rainha (que, entretanto, mudara de nome). Por 350 escudos por ano, mudou-se o clube para a Constituição.

Mais uma desfeita. Em finais de 1911 foi comunicado ao F. C. Porto que teria de abandonar o campo atlético da Rua de Antero de Quental, que fora o sonho grande, realizado, de José Monteiro da Costa, para que, em seu lugar se erguesse uma... fábrica. Entre ânsias e descrenças, avanços e recuos, lançaram-se hipóteses várias para a construção de um espaço onde continuassem, com o mesmo ardor e a mesma fascinação, os festivais de pesos e alteres, os concursos de atletismo, os encontros de ténis, os grandes desafios...
No dia 29 de Julho de 1912, a Direcção reuniu-se, enfim, para apreciar uma «proposta tentadora»: um terreno da Rua da Constituição, que dava bem para campo de jogos de futebol, ténis, sede e muito mais...
Que sim, que sim. Pelo que, nesse mesmo dia, ficou resolvido alugar o espaço proposto, por 350 escudos anuais — perto de 30 escudos por mês — e encetar as obras de imediato. Urgia.
Documentos oficiais apontam para a mudança feita no dia 29 de Setembro de 1912. De facto, a secretaria do clube começou a funcionar, na Constituição, no dia 4 de Novembro. Num barracão mal acomodado. Eram sinais dos tempos, indícios de um clube em crise, órfão do presidente mobilizador e, sobretudo, financiador.
Apesar de, oficialmente, o Campo da Constituição ter sido inaugurado com um torneio internacional de futebol, que decorreu entre 26 de Janeiro e 2 de Fevereiro de 1913, com a presença do Real de Vigo, Oporto Cricket, F. C. Porto e Benfica (que venceria), o primeiro jogo lá disputado opôs, a 1 de Janeiro, os portistas ao Oporto Cricket (clube que fornecia, amiúde, os seus jogadores ao F. C. Porto), cabendo a vitória aos ingleses, por 5-2.
No Torneio da Inauguração, contra o Benfica, derrota do F. C. Porto, por 1-3. Na final, apesar da vitória dos lisboetas, sobre o Vigo, mosquitos por cordas. E para além de escaramuças, uma crónica anti lisboeta, que fala de pacóvios, de desrespeito pelos «sportmen» do Porto e de senhores que «parece que comem gente»...
«Da parte do Vigo houve algumas rasteiras e pontapés propositados. O Benfica respondeu de igual modo, com violências e cargas à margem da lei do ‘football’. Chegámos a ver um jogador de Lisboa agarrar por um braço um espanhol, quando viu frustradas as tentativas para lhe tirar a bola.
Sejamos justos e não nos ceguem, nem o exagerado patriotismo, nem o partidarismo de clubes levado ao excesso.
Isto é tanto menos admissível, quanto o grupo espanhol tem menos peso do que o do Benfica e os seus jogadores são fisicamente mais fracos.
A extrema correcção de Cosme Damião e Fernando de Castro, capitães dos grupos, evitou, por vezes, conflitos que, em dado momento, se poderiam agravar.
Dois jogadores, um espanhol e outro português, caíram juntos em certa altura do desafio. Ainda no chão, o jogador espanhol deu, cremos que voluntariamente, um pontapé na cara do seu adversário. Este desforrou-se com um ou mais socos. Nesta confusão chegou a ser agredido por um sócio do Benfica, que dizem chamar--se Vieira, o simpático capitão do Vigo, Fernando de Castro, que nada tinha com o caso e apenas interveio no sentido de apaziguar.
É preciso, de futuro, que os senhores de Lisboa que aqui venham assistir aos desafios, se compenetrem de que, fora de casa, têm de ser delicados. Não se admite que façam dos jogadores e sportsmen do Porto a ideia que fariam de quaisquer ignorantes pacóvios que nunca tivessem visto mundo, e a quem continuamente assustassem com a frase: se fosse em Lisboa...
Esta frase, aplicada a propósito de tudo, fez dizer a um espectador portuense: ‘Que diabo, os senhores em Lisboa parece que comem gente.
E é facto. Se fosse em Lisboa — dão a perceber — não teria ficado vivo um único jogador espanhol!»

A máquina de amputações, a noiva e o estrume

A propósito da inauguração do Campo da Constituição, antes ainda de saber no que daria o Torneio Internacional de Futebol (o primeiro disputado em Portugal) escreveria Botelho de Sousa, um dos mais notáveis jornalistas portuenses de então, crónica deslumbrante, retrato exótico dos primeiros passos de um clube que nem sequer imaginaria que destino estava a construir...
«A notícia da inauguração do novo parque de jogos do F. C. Porto trouxe-nos a deliciosa recordação de que, há bons 10 anos, trabalhara um grupo de sportsmen — verdadeiros apaixonados pelo football, ao tempo cultivado por uma pequena falange de ingleses, para levar à prática a ideia da fundação de um clube portuense de football. Naquele tempo, repito, todos supunham uma rematada loucura tal iniciativa. Aquilo, dizia-se, era um jogo semelhável a máquina de amputações, onde as pernas se partiam e as canelas saíam mimoseadas com terríveis equimoses, mercê dos pontapés vibrados pelos adversários em defesa da bola!
Que luta, que trabalho extraordinário tiveram dois saudosos footbalers para convencer os nossos ‘sportsmen’ de que o ‘football’, muito longe de produzir fracturas nas peças locomotoras, lhes dava resistente vigor! Após trabalho verdadeiramente notável, a todos os títulos, conseguiram, enfim, a constituição de um team e o arrendamento de um campo.
No domingo anunciado para a luta, o campo encheu-se de um público que, ignorando os princípios do ‘football’, supunha ir assistir a uma batalha entre doidos e que a arma empregada seria o pontapé. O ‘match’ (!) decorreu tumultuoso. De quando em vez rolava pelo chão um português, impelido pelos encontrões dos ingleses.
— Morram os bifes! — Gritava o público que ocupava o lugar destinado aos peões.
— Prega-lhe um pontapé na barriga! — Ouvia-se doutro lado.
A bola andava numa dobadoira, com os formidáveis shoots vibrados pelos portuenses. Um dos forwards, atacando o goal, após impetuosa corrida, caíra, ficando com um joelho marcado pelo verde-negro do arrelvado e da terra lamacenta... Findo o match, uma massa de povo invadiu o campo, dirigindo-se para o local onde os footbalers se encontravam e com o olhar investigador procurava nas canelas dos rapazes as... negras.
Abandonam as bancadas e descem o campo algumas senhoras que para ali foram na intenção de mostrar as suas toilettes magnificentes.
Uma delas, elegante como uma miss, linda como uma... portuense, noiva do desastrado que caíra, acercou-se-lhe e, ao ver-lhe o joelho. Gritou: — Ah! Alfredo! Podes ficar sem uma perna! Carinhosamente, com aquela candura que possuem as senhoras quando estão noivas (só quando estão noivas!), preparava-se para cuidar o ferimento, quando o Alfredo exclamava, furtando o joelho: - Oh! Não, meu anjo, não ponha a mão que cheira mal...
O campo fora estrumado dias antes!
In «abola»
 
H

hast

Guest
As chiquérrimas patinadoras

A patinagem foi uma das «meninas dos olhos» de José Monteiro da Costa. Na Constituição, construir-se-ia um rinque, pago por três associados. O luxo custava cinco tostões...

Logo após a (re) fundação, o F. C. Porto promoveu na Garagem Auto-Motora elegantes sessões de patinagem, que contavam sempre com a presença das mais chiques senhoras do Porto, cujo nome, depois, surgiria escarrapachado nas páginas de sociedade dos jornais mais selectos. Mas, a certa altura, desinteligências entre os portistas e a gerência da Auto-Motora colocariam em ponto-morto tão aristocráticas sessões. Mas foi-se aquecendo a nostalgia delas...
Até que, a 8 de Setembro de 1913, os associados Joaquim Pereira da Silva (dirigente que tinha uma farmácia na Rua de Antero de Quental), António Martins Ribeiro e Manuel Ribeiro da Silva, apresentaram proposta para a construção de um rinque na Constituição — inteiramente à sua custa. O clube ficaria encarregue da sua exploração, promoveria sessões de patinagem, cobrando, mensalmente, $50 a cada sócio que fizesse tenção de utilizar o espaço, e a receita líquida amortizaria a verba gasta com a construção.
Para facilitar a construção, suspenderam-se as provas de pesos e halteres, marcadas para a noite, decidindo-se, também, aumentar, de imediato, o empregado do campo para 3$00 mensais, compensando-o, assim, pelos serões a que ficaria obrigado por causa das sessões de patinagem.
O rinque de patinagem seria considerado pronto em 18 de Maio de 1914. A comissão encarregada de o construir apresentaria à Direcção a que pertenciam Joaquim Pereira da Silva, A. Marques e Silva, António Manuel Rodrigues de Oliveira e Armando Cruz, a nota da despesa total — 405$28. Segundo Rodrigues Teles, essas importâncias seriam pagas pelos seus componentes na seguinte proporção: António Martins Ribeiro, 30$00; Joaquim Pereira da Silva, 150$00 e António Manuel Rodrigues de Oliveira, 225$28.
Rodrigues Teles exaltou: «E após uma simpática invasão de patinadoras e patinadores (ainda em Abril), efectuou-se um festival e disputou-se um campeonato entre adeptos. Também se realizou um Torneio de Ténis — e nesse festival desportivo se fez ginástica. O F. C. Porto, persistente e verdadeiro clube de desporto, fez regressar a prática da patinagem a cavalheiros e distintas senhoras que animavam sempre os seus festivais da Auto-Motora — e o Campo da Constituição transformou-se ainda em recinto mais elegante e completo».
In «abola»
 
H

hast

Guest
Festas no barracão e jogos polémicos.

A sede do F. C. Porto instalou-se num barracão da Constituição. Numa das suas salas, jogavam-se cartas. A Direcção decidiu proibi-lo e a polémica rebentou.

Em crise profunda, as finanças do F. C. Porto. Horizonte carminado, na falta da bolsa de José Monteiro da Costa. E com o País igualmente em agonia, poucas as chances de surgirem mecenas ou idealistas. Mas imaginação não faltava entre os portistas. Assim, em Novembro de 1913, a Direcção decidiu organizar uma tourada em Espinho, revertendo a receita em benefício do clube. Essa iniciativa rendeu 140$60. Para satisfazer o pagamento da nova canalização do balneário, imprescindível para que os jogadores pudessem ter banho quente, faltavam apenas 1$50. Assim, foi sem espanto que se resolveu, na sessão da Direcção de 4 de Novembro, que a verba recolhida em Espinho seria aplicada na canalização, «não sendo difícil prover a verba em falta». Pudera...
A sede continuava (e continuaria anos a fio) instalada num barracão da Rua da Constituição, com pequenas janelas envidraçadas viradas para o campo de futebol, mas à qual se tentava dar o possível ar de dignidade, sobretudo quando nos seus aposentos se ofereciam «copos-de-água» às equipas adversárias, a fim de provar a simpatia e a hospitalidade do F. C. Porto. E havia, também, num dos seus recantos, um velho bilhar e noutro mesas para jogo de cartas.
Mas, em 1919, o clube seria obrigado a renegociar o contrato de arrendamento da Constituição. Pelo que o velho terreno seria onerado em 50$00 e, não muito depois, em 100$00. «No dia 18 de Agosto de 1919 foi assinado novo arrendamento — pelo prazo de 10 anos, com o compromisso de os primeiros serem pagos a 400$00 e os restantes cinco a 450$00.»
Este contrato seria celebrado entre o F. C. Porto e um «Conselho de Família» nomeado pelo Juiz dos Órfãos, visto a proprietária do campo ser menor de idade, e nessa altura resolveu a Direcção do Clube, composta por Ernesto de Oliveira (presidente), Ivo Lemos, Theodoro Sachse e Manuel da Silva Torres, fazer nas instalações do clube algumas obras. E mais do que isso, operações de drenagem. Acabaria por se imolar no fogo ateado pelo seu idealismo.
Um dia, estadeou-se nos corredores da secretaria, um aviso que mexeu com as consciências. «A Direcção, desejando fazer cumprir rigorosamente os Estatutos e Regulamento do Clube, resolve abolir desde já toda e qualquer espécie de jogos nas suas dependências, e participa que a sala onde ordinariamente alguns associados costumam jogar as cartas vai ser adaptada a um ginásio que funcionará com um regulamento a elaborar. A Direcção participa que tenciona proporcionar aos senhores associados exercícios de pusching-ball e fazer introduzir no seu ginásio a prática de boxe e luta»
A atitude foi considerada, naturalmente, bastante violenta. E criou alguns anticorpos. Como criaria outra, a propósito das tabelas para utilização da Constituição. Rodrigues Teles conta: «Ainda por causa dos novos encargos da renda foram elaboradas tabelas de aluguer do campo. O Salgueiros, o Vilanovense e o Sporting de Espinho inscreviam-se no Campeonato com o Campo da Constituição, e fixaram-se então as seguintes condições: Aluguer por um dia ou parte de um dia: 20$00; aluguer por dois dias ou parte de dois dias: 30$00. Além desta base de preços mínimos, o F. C. Porto cobrará uma percentagem convencional sobre a receita bruta de qualquer festa ou torneio com entradas pagas. Os sócios do clube terão entrada livre no recinto da Constituição e o imposto de selo que corresponda à sua entrada deverá ser abonado pelo concessionário.»
Certo é que a Direcção presidida por Ernesto de Oliveira se manteve pouco tempo em exercício. Alguns associados discordaram de muitos actos de gerência e em Agosto desse ano resolveram demitir-se todos os seus componentes. No dia 5 de Setembro tomou posse a primeira Comissão Administrativa — e no mesmo dia, por proposta de Alexandre Cal — «foram considerados nulos e sem efeito alguns avisos e tabelas afixadas pela última Direcção».
Reabria-se, assim, a sala de jogos, entretanto enriquecida com um bilhar oferecido pelo director Emílio Marques Ferreira, também atleta do clube. E o ordenado do empregado de campo passou a ser de 3$60 mensais. Para que as instalações não fechassem tão cedo...

As bancadas do contrato violado.

A expansão do futebol e do F.C.Porto, refulgindo de ano para ano, obrigaria a massa associativa e os seus dirigentes a pensarem na construção de um novo estádio, que fosse melhor reflexo da grandeza de um clube a caminho de sonhado fastígio. A ideia foi aquecendo dia a dia, até que, em 1920, António Cardoso Pinto de Faria se transformou em campeão da fuga ao acanhamento da Constituição, cerzindo solução simples: a compra de terrenos anexos, pertencentes à família Couto. E comprar-se-ia, igualmente, o palacete que ficava de frente para a Rua da Constituição, «incluído na quinta, e muito próprio para sede». Tudo falharia, por um triz — mas falharia...
Pelo que, em 1922, começaram a negociar-se os terrenos da Quinta das Oliveiras, em Nova Cintra, cujo proprietário entrara, ele próprio, nesse sentido, em contacto com o FCP. Estabeleceram-se compromissos, mas os donos do terreno não lhe obedeceram e acabaram obrigados a indemnizar o F. C. Porto com a importância de 20 contos, perdendo-se, assim, solução considerada magnífica, naquela altura, para os interesses e anseios do clube.
Mas há males que vêm por bem... Com os 20 mil escudos recebidos pela denúncia do acordo da Quinta das Oliveiras, haveria de construir-se as bancadas que ainda hoje existem no Campo da Constituição, precisamente de costas para a Quinta Couto, que acabaria vendida, mas não ao F. C. Porto.
In «abola»
 
H

hast

Guest
Derrota amarga no campeonato.

O F. C. Porto empenhou-se na fundação da AFP e na organização do seu primeiro campeonato regional, que foi ganho pelo Boavista, graças ao seu guarda-redes, que era do... F. C. Porto.

O primeiro campeonato regional promovido pela Associação de Futebol do Porto feriu-se no ano de 1914, mas o F. C. Porto não logrou o título de «primeiras categorias». A preocupação de ganhar a Taça José Monteiro da Costa, até então «campeonato do Norte de Portugal», pesava bastante no ânimo dos jogadores portistas, cujo fito não era outro que não a reconquista em Coimbra do sentimental troféu.
O Campeonato do Porto abriu hostilidades com apenas três clubes em volta do título: Boavista, Leixões e F. C. Porto. Os portistas trabalharam com entusiasmo na sua organização. A AFP estava instalada na sua sede e os seus homens eram os seus principais dirigentes.
No dia 4 de Janeiro, o primeiro jogo do Campeonato do Porto. No Bessa. Vitória do Boavista, por 2-1. O F. C. Porto apesar de actuar desfalcadíssimo (quase com a sua equipa de «segundas categorias») dominou a contenda, «mas a falta de remate não lhe permitiu obter resultado favorável». Brilhante o trabalho de Wrigth na baliza do Boavista. Wrigth era, então, guarda-redes do... F. C. Porto, mas fora cedido ao adversário, por questão de cortesia, já que para defesa das suas balizas tinham os portistas Peter Janson ou Manuel Valença.
No domingo seguinte, o Boavista venceu, facilmente, o Leixões, por 9-0. Pelo que os boavisteiros viriam a ganhar o título num jogo decisivo, sustentado com o F.C.Porto, no dia 1 de Março de 1914, na Constituição. Empate a um golo. «Se bem que o F.C.Porto tivesse dominado com muita insistência, especialmente na primeira parte, mas... não se registaram golos. No segundo tempo, após a marcação de um pontapé de canto, o Boavista obteve o seu golo por intermédio de Fernandes. O F. C. Porto reagiu, submeteu o adversário a uma defesa porfiada e Charles Allwood acabou por estabelecer o empate que colocou o Boavista com 5 pontos, contra 3 do F. C. Porto e zero do Leixões».
A grande figura voltou a ser o guarda-redes Wrigth, que o F. C. Porto cedera ao Boavista, preferindo Peter Janson e Manuel Valença para a defesa das suas balizas e suplente delas. Nessa partida, pelos portistas alinharam Peter Janson; Harrison e Vitorino Pinto; Mário Maçãs, Charles Alwood e Magalhães Bastos; Camilo Moniz, Carlos Megre, Constantino Encarnação, Legg e Ivo Lemos.
Era abertura com pé esquerdo. Mas, os portistas acertariam o passo e entre 1914 e 1947 só não haveriam de ganhar as edições de 1918 (Salgueiros), 1940 (Leixões) e 1942 (Académico).
In «abola»
 
H

hast

Guest
Capitão-geral e dinheiro do bolso

Em seis anos houve dança de presidentes. Exaltou-se quando se apurou um lucro de 82$57. Apesar de algumas dívidas pagas do bolso dos próprios dirigentes

Em 1914, António Elisabeth de Mesquita presidia à Assembleia-geral do F. C. Porto. A presidência da Direcção cabia a António Borges de Avelar, que, no final do seu mandato receberia aceno dos sócios do F. C. Porto, por «ter posto em relevo o progresso desportivo e financeiro do clube», cujo saldo do exercício se cifrou em 82$57,5, apesar de estar ainda por liquidar o débito de 235$83 aos herdeiros de José Monteiro da Costa. Não admirou, pois, que os Órgãos Sociais fossem reconduzidos.

Falta de tino administrativo

A 27 de Junho de 1916, a Borges de Avelar, que assumiria a presidência da Assembleia-geral, sucederia António Martins Ribeiro. Mais turbulenta foi a sua gestão, de tal modo que, numa Assembleia-geral realizada a 26 de Junho de 1917, Ernesto de Oliveira, fluente e enérgico, insurgiu-se contra o facto de a Direcção não ter apresentado Relatório do seu mandato. António Manuel Rodrigues de Oliveira, o tesoureiro, saltaria a terreiro, em defesa da sua dama, asseverando que não se fizera Relatório por se viver em crise profunda — eram os tempos da guerra e dos racionamentos — e que por isso se julgara de maior prudência poupar ao clube o custo do papel, trocando o Relatório pela apresentação de mapas de contas. A maioria compreendeu e perdoou. Ernesto Oliveira acabaria por propor que se lastimasse a falta do Relatório, «embora louvasse a Direcção pelo seu trabalho».
Carlos Lello, nessa mesma reunião, aventou a eleição de um capitão-geral para as equipas de futebol, que deveria ser «pessoa criteriosa, da absoluta confiança da Direcção e não em exercício de qualquer cargo dentro da mesma», sendo, para além de outras, das suas atribuições «a mudança de jogadores, de acordo com os capitães dos diversos teams, que terão de lhe obedecer da mesma forma que os jogadores obedecem aos seus respectivos capitães».
Gerou-se acesa discussão entre sócios, havendo quem considerasse que a escolha do capitão-geral deveria competir à Direcção e não aos sócios. A tese não vingou e a 22 de Janeiro de 1918, João António Gonçalves da Cal e Carlos Megre Restier seriam eleitos (por unanimidade!) capitão-geral e vice-capitão. A 24 de Julho, Henrique de Mesquita assumiria a presidência da Direcção do F. C. Porto, cabendo a Rodrigo da Rocha Beça presidir à Assembleia-geral. A 3 de Agosto de 1919, o presidente seria reconduzido, mas para a presidência da Assembleia-geral escolher-se-ia Joaquim Pereira da Silva...
Mas, a 1 de Setembro, tempestade muito mais agreste. Em Assembleia-geral Extraordinária, através de um ofício, a Direcção apresentava o pedido colectivo de demissão. Da acta da reunião consta: «O Sr. Ernesto de Oliveira expôs os motivos que levaram a Direcção a pedir a demissão. Explica que, tendo-se levantado uma campanha contra a Direcção eleita, desejava que os factos fossem claramente expostos, e assim o faz, narrando o que se tinha passado entre a Direcção e o antigo presidente Sr. Henrique de Mesquita, que insistiu em não aceitar o cargo para que foi eleito. Faz várias considerações sobre a administração da colectividade, acusando as últimas Direcções de falta de tino administrativo. O Sr. Ivo de Lemos explicou qual o débito do clube nos anos económicos de 1916-17, 1917-18 e 1918-19. O Sr. Henrique de Mesquita explicou várias verbas de contas que aumentaram o débito do clube e dirigindo-se em seguida ao Sr. presidente (Joaquim Pereira da Silva) provoca explicações deste Sr. O Sr. Henrique de Mesquita, prosseguindo, dá mais explicações sobre despesas várias, afirmando ter pago muitas contas do clube do seu próprio bolso.»
Escarolada a roupa suja, sairia da Assembleia uma Comissão Administrativa, composta por Henrique Mesquita (o presidente que antes dissera que não o seria), Camilo Moniz, Alexandre Cal, Emílio Ferreira e Francisco do Nascimento Couto. A 31 de Agosto de 1920 seria, enfim, eleita nova Direcção, presidida por António Cardoso Pinto de Faria, sendo presidente da Assembleia-geral António Borges de Avelar.
In «abola»
 
H

hast

Guest
Excursionistas, goleadas e alugueres.

O F. C. Porto alugava o seu campo à razão de 1$50 por jogo e $20 a toalha. Com o Benfica sucediam-se as goleadas. Mas pior seria um polémico jogo com o Académico

Em 1915, o Boavista não se inscreveu para a disputa da Taça José Monteiro da Costa. Eram sinais de uma luta intestina que se entrevira já. A novidade à compita era o Académico do Porto, que após ter batido o Leixões por 7-2, se apurou finalista da competição. Com o F. C. Porto, naturalmente. Mas, antes da peleja, os portistas jogaram em Vigo, com o Real, que, entretanto, empatara com o Sporting. Organizou-se uma excursão por dez pesetas e 2$10 em dinheiro português. Os portuenses baqueariam, mas não foi grande a mágoa, já que, pouco depois ganhariam a quinta edição da Taça José Monteiro da Costa.
Mais se soube que, por esse tempo, os directores do F. C. Porto, presididos por António Borges Avelar tinham decidido alugar o Campo da Constituição ao Salgueiros à razão de 1$50 por jogo e $20 por toalha utilizada no duche.
A 20 de Novembro de 1915 jogaria o F. C. Porto o seu primeiro encontro oficial com o Académico do Porto, para o Campeonato da AFP. Ganharia por 5-1, resultado que só no ano seguinte se veria como importante fora, por permitir que o título de campeão do Norte não fosse parar aos neófitos academistas. Duas semanas volvidas, o Académico entraria em litígio com a Associação de Futebol do Porto, por desejar incluir nas suas linhas Germano de Vasconcelos (que após ter fulgurado como velocista e futebolista do Benfica jogara pelo Boavista) e castigado pela entidade regional — ameaçou abandonar o campeonato. Manobras de bastidores impedi-lo-iam, pelo que só a 9 de Janeiro de 1916 se reencontrariam.

21 Golos em três jogos!

Antes disso, nos primeiros dias de 1916, ano em que, fora do futebol, apenas Carlos Oliveira refulgiria, sagrando-se duplo campeão nacional de pesos e halteres, título que mantinha desde 1911, deslocou-se a Lisboa para, no novo Campo de Sete Rios disputar um torneio quadrangular, organizado pelo Benfica, contando, também, com os suíços do Montriond Sport de Lausanne e os espanhóis do Racing de Madrid.
No primeiro encontro, os benfiquistas esmagaram os portistas: 9-0! O Benfica alinhou com Stock; Mocho e Henrique Costa; Cândido de Oliveira, Cosme Damião e Figueiredo; Alberto Rio, Carlos Sobral, Francisco Pereira, Artur Augusto e Herculano Santos. O F. C. Porto lançou à liça Cyril Wrigth; José Ferreira e Harrisson; Mário Maçãs, Napoleão Palma e Pinheiro; Eduardo Coquet, Ivo Lemos, Joaquim Reis (Farrapa), Hamilton e Floriano Pereira. No dia seguinte jogou o F. C. Porto contra os suíços do Montriond.
Outra goleada: 0-6! Andavam, pois, os portistas em bolandas, de tal forma que, oito dias depois, a 9 de Janeiro de 1916, averbariam, na Constituição, uma das suas mais históricas derrotas: 2-6 com o Académico do Porto, em jogo a contar para o Campeonato da AFP. Só não foi mais dura a agrura porque, na primeira volta, ainda em 1915, o F. C. Porto vencera por 5-1. Mas antes da euforia da goleada, os academistas, «capitaneados» por Neves Eugénio, estiveram para abandonar o campo. O jornalista Manuel Camanho registou com mágoa indisfarçável o acontecimento, juntando-lhe dois lamentos: «O desânimo que se apoderou de todos, sem excepção de um, dos jogadores do F. C. Porto, que durante os últimos vinte minutos de jogo se desorientaram de uma forma incompreensível; e o gesto verdadeiramente anti desportivo do Académico F. C. que pretendeu abandonar o campo de jogo ao ser-lhe marcada uma bola, a nosso ver legalmente feita, o que podia acarretar-lhe as piores das consequências se Américo Pacheco (o árbitro do Leixões) quisesse suscitar um incidente que mais viria agravar a situação do nosso meio de futebol, que era nem mais nem menos que o marcar ao Académico uma derrota, por ter desrespeitado uma sua decisão. Queremos crer que Neves Eugénio o fez irreflectidamente e, se assim foi, tem alguma desculpa, se bem que não deva ser esse o recurso daqueles cuja orientação se está evidenciando como um das poucas que hão-de elevar o valor do Académico».
Mosquitos por cordas andaram, quando o Académico ganhava por 2-0, Maçãs Fernandes magoou-se seriamente no nariz e foi forçado a abandonar o campo. De súbito, golo do F. C. Porto, apontado por Almeida Coquet, que haveria de tornar-se jornalista reputado. O lance foi contestadíssimo e como que em revolta de orgulho ferido Neves Eugénio instigou os seus companheiros a abandonarem o campo. Demovido seria e, nos últimos vinte minutos, com três golos seus e mais um de Figueiredo o Académico chegou a 6-2. Como na primeira-mão» perdera por 5-1, houve que recorrer a jogo de desempate para se apurar o campeão do Porto. A finalíssima, em Março, seria esmaltada de emoção. Ao intervalo, o Académico vencia por 2-0, mas nos últimos 45 minutos, os portistas, em virtude de cavalgada impressionante, apontaram três golos, por intermédio de Floriano, Hamilton e Webber.
Findo o campeonato, o F. C. Porto voltou a convidar o Benfica para a Constituição. Perdendo de novo. Por 0-3. Mas esse foi, também, o ano da conquista definitiva da Taça José Monteiro da Costa. Cuja última edição seria essa mesma.
In «abola»
 
H

hast

Guest
As taças na ourivesaria

O Benfica que continuava a fazer das suas contra o F. C. Porto, de uma vez transformou Cândido de Oliveira de jogador em... árbitro. Continuando a ganhar

Era já tradição. Coisas de amigos. Apesar das rivalidades quentes e de, por vezes, algumas escaramuças. Em 1917, o F. C. Porto voltou a convidar o Benfica para dois jogos na Constituição. O primeiro haveria de ser contra um misto F. C. Porto-Boavista-Académico. Não foi e os portistas apresentaram uma equipa de recurso que seria esmagada pelos benfiquistas: 1-9!
No dia seguinte, ante a primeira categoria do F. C. Porto, o Benfica retirou Cândido de Oliveira da equipa, dando-lhe a missão de... árbitro. E os campeões de Lisboa voltaram a vencer. Por 3-1. Um respigo de uma crónica de um jornal do Porto: «Na primeira parte o F.C.Porto era vencedor por uma bola, que o próprio Germano enviou às redes ao tentar defender um pontapé de canto. O ataque do Benfica trabalhou o mais que pôde, mas nada conseguiu porque Aires estava oportuno e teve defesas que entusiasmaram o público. E o mesmo sucedeu com Harrisson que salvou o grupo em situações muito críticas. Já no segundo tempo, registou-se a primeira bola do Benfica, marcada sem grande brilho e por culpa de um jogador portista. O Benfica joga com brilho. Os seus remates fortes são bem dirigidos. O F. C. Porto é castigado com uma grande penalidade, devido a uma mão. Marca-a Rio, mas Aires defende. Mantém-se o jogo sobre os postes de Aires. Há um novo pontapé em que ninguém tem esperança... mas Artur Augusto transforma-o, muito bem, elevando o resultado para 2-1 a favor do Benfica. Pouco tempo depois é marcada nova grande penalidade, mas, desta vez, transformada em terceira bola... Houve incorrecções de alguns jogadores do Benfica. O público protestou, por vezes, contra os \'trucs\' de Veloso, que chegou a enlaçar o guarda-redes portista. Luís Vieira e José Vieira também se evidenciaram em incorrecções. Nada mais houve digno de registo, a não ser a resistência mantida pelo F. C. Porto e o resultado bem dignificador que obteve. A arbitragem de Cândido de Oliveira foi, por vezes, deficiente.»

Estreia a perder com o Sporting

A 17 de Fevereiro, o F. C. Porto retribuiu a visita, jogando em Sete Rios. As vitórias sucessivas sobre os portistas despertaram escasso interesse entre os benfiquistas. Assim, com pouca gente nas bancadas, os lisboetas vencem por 4-0. Dois dias volvidos, novo jogo, nova derrota dos portuenses: 2-5. Ao intervalo, o F. C. Porto vencia por 2-0 e, reza a crónica, «o grupo fora muito aplaudido». Contudo, na segunda parte, o Benfica «trabalhando melhor e com mais ânimo» marcou cinco golos.
Novidade seria o convite para que o Sporting fosse à liça na Constituição. Foi e ganhou por 4-1, trazendo, uma vez mais, à colação a superioridade das equipas de Lisboa...
Contudo, a Norte, os portistas continuavam reis e senhores. Invictos e avassaladores. Ganharam a Taça de Honra da AFP, a Taça Salão Sporting, a Taça Imprensa Sportiva e o Campeonato Regional. Apesar da equipa de futebol esventrada pelas mobilizações para a Guerra. Seria, pois, com garbo que, a 16 de Setembro de 1917, quinze dias depois de ter sido inaugurado, na Constituição, o Campo de Lawn-Ténis, em substituição do rinque de patinagem, que a Direcção, presidida por Henrique Mesquita, estadeou as taças conquistadas pelo clube na Ourivesaria Boneville, na Rua de Santo António.
In «abola»
 
H

hast

Guest
A rebelião pelos almoços pagos

O F. C. Porto ainda não tinha o luxo das massagens que o Benfica pagava a preço de ouro. E rebelião houve, uma vez, por causa de almoços pagos a um jogador pobre.

Em 1917, o Benfica tinha um massagista particular, o sueco Boo Kullberg, que, para além de professor de ginástica, haveria também de tornar-se o seu primeiro treinador de atletismo. Pagava-lhe pelo serviço de massagens 40 escudos por trimestre! O F. C. Porto não se podia dar a tais luxos. Aliás, nas viagens a Lisboa ou a terras mais distantes eram os próprios futebolistas que suportavam as despesas de alimentação. Por isso, por vezes, quando as finanças dos atletas estavam em crise, pediam dispensa e não se deslocavam longe. Por falta de dinheiro para comer. A menos que...
Por esse tempo, o F. C. Porto teve de controlar um movimento de insubordinação dos seus principais futebolistas, que deixaram, inclusivamente, a latejar a hipótese de greve. Tudo porque descobriram que um deles fora a Viana do Castelo (onde os portistas bateram o Racing de Viana, por 6-0) com tudo pago.
Henrique Mesquita quedou-se absorto, de rosto atormentado, ao olhar para o documento subscrito por um grupo de jogadores, solicitando «o reembolso do dinheiro gasto em Viana do Castelo, visto que um colega, segundo era do seu conhecimento, fora indemnizado».
De emergência convocou os futebolistas para uma reunião no seu gabinete, asseverando-lhes que «apenas Joaquim Reis, um dos maiores jogadores da época, recebera as despesas, por se tratar de um elemento muito pobre». «De resto», acentuou, «antes da viagem a Viana do Castelo fora prometido a Joaquim Reis o reembolso, por estar provada a sua incapacidade financeira...».
Como tudo ficou, assim, devidamente esclarecido, os recalcitrantes deram o conflito por arrumado, sublinhando que apenas aceitavam a violação aos princípios sagrados do amadorismo por uma questão de... «solidariedade social».

A polémica dos mil escudos para tratar jogador doente.

Contudo, Joaquim Reis, conhecido por «Farrapa», que acabaria a sua carreira de futebolista no Salgueiros, voltaria a ver-se envolvido em questão de contestação financeira em 1921. Com caso tratado em plena Assembleia-geral, realizada a 24 de Setembro. Fazendo fé na acta da reunião, Carlos Lello, um sócio de grande prestígio e verbo fácil e inflamado, depois de dizer que «o parecer do Conselho Fiscal é bem sintomático na parte relativa às contas da Direcção e, por isso, não quer estender-se em discussões», aquiesceu que «seria do seu agrado um esclarecimento à razão por que nas mesmas contas figura uma despesa de mais de mil escudos com o jogador Joaquim Reis, sendo certo que os estatutos não permitem tais despesas». Pelo tesoureiro, José Cardoso de Faria, foi esclarecido que «tendo adoecido com aparente gravidade esse jogador, e devido aos esforços e trabalhos que o mesmo tinha dedicado ao clube, a Direcção julgou que deveria tratar da saúde a esse jogador, tanto mais que a sua situação financeira não era de molde a poder tratar-se como devia e só por esta razão é que auxiliámos monetariamente tal jogador». Retorquiu o presidente da Assembleia-geral, dizendo que «moralmente tal auxílio deveria ter-se prestado, mas para ser legal tal auxílio a Direcção deveria ter convocado uma Assembleia-geral», acreditando que esta não regatearia tal auxílio, lamentando, portanto, que isso tivesse «deixado a Direcção numa falta relativamente grave». Mas, segundo a acta da Assembleia-geral, «nessa altura, e depois de acalorada discussão, o Sr. tesoureiro José Cardoso de Faria declarou que, em virtude do que se passava, não tinha dúvida em ceder do seu bolso particular a importância que motivou tal discussão», sublinhando o secretário que «essa afirmação valeu-lhe da parte da Assembleia uma manifestação de agrado, pois mais uma vez provou, desta maneira, os seus desinteressados serviços para com o clube».
In «abola»
 
H

hast

Guest
Vidal Pinheiro morto em combate.

Vidal Pinheiro era dos mais carismáticos futebolistas do F. C. Porto. Tombaria na batalha Flandres. Houve quem, na Constituição, chorasse de raiva...

Em 1917/18, o F. C. Porto perderia o título de campeão do Norte. Não tanto pela dificuldade de organizar equipas, já que alguns dos seus melhores futebolistas andavam por esses dias metidos, obviamente a contragosto, em mortíferos jogos de guerra, nos campos de batalha da I Grande Guerra, mas, sobretudo, por a Associação de Futebol do Porto ter suspendido de actividade o clube, em Março de 1918.
Mas, mais do que a perca do título, doeram outras percas, causadas por essas tenebrosas malhas que o destino tece.
A equipa de futebol estava amputada de alguns, gente de valor e carisma. Casos mais flagrantes, os dos ingleses, quase todos chamados para a tropa do seu país, mas também de vários outros, que não só do futebol. Floriano Pereira esteve à beira da tragédia. Livrou-se. Pior sorte teria o tenente Vidal Pinheiro, que pouco antes da partida ajudara à conquista definitiva da Taça José Monteiro da Costa, sendo, para além de grande futebolista, um dos melhores atletas do clube. Apesar de considerado, hoje, nos anais da História, como herói da Flandres, tombaria nas suas trincheiras, na terrível batalha de 9 de Abril de 1918.
A notícia da sua morte seria conhecida em Portugal em Maio. Os seus companheiros de equipa, ao despedirem-se do «bravo oficial do exército», que para tantas vitórias portistas contribuíra, prometeram ao capitão Vidal Pinheiro que à sua chegada como... herói, haveriam todos de dar grande festa em sua honra. O destino, implacável, frustrara a promessa. E quando no campo surgiu o jornal com a notícia fria, chocante, da sua morte, todos os que por cá ficaram, sofrendo também, verteram lágrimas de saudade e comoção. E nem o facto de ter «morrido ao serviço da Pátria» calou alguns desabafos de revolta. Pelo destino. E pelo que os homens (des) fazem por via das suas ambições ou das suas loucuras.

Os soldados que não se esquecem

O F. C. Porto, embora ferido pelas faltas inevitáveis, não se esqueceu dos seus soldados, dos seus oficiais. Nem dos que eram adversários. Nem dos desportistas aliados. Assim, na Assembleia-geral de 2 de Janeiro de 1918, em ambiente de sentida emoção, apresentou Ivo Lemos uma moção que os associados do FCP aprovaram por aclamação, propondo para além de «um voto de sentimento pela perda de todos os homens do desporto de qualquer nacionalidade que morreram nos campos de batalha» e que fosse «criado um quadro de honra que será colocado numa das dependências do clube e que deverá mencionar os nomes de todos os sócios que morram nos campos da batalha ou regressem inutilizados para o desporto, demonstrando por essa forma que o F. C. Porto não os olvida».
Ninguém imaginaria, contudo, que Vidal Pinheiro, cujo carisma se acastelara já em torno de todos os portistas, pela sua postura de homem galhardo e desportista imaculado, cairia, algumas semanas depois, fulminado pela metralha alemã. Como tantos outros. Estupidamente.
In «abola»
 
H

hast

Guest
A outra guerra e as asneiras

Em 1918, o F. C. Porto entrou em guerra com AFP. A ousadia valeu-lhe suspensão do Campeonato, em cuja final o árbitro apitaria de botas altas e esporas...

As relações entre o F. C. Porto e a Associação de Futebol do Porto, presidida por João Diogo Campos Carmo, azedaram. E, nos primeiros meses de 1918 começaram a sentir-se as ondas de choque. Pouco demoraria a rota de colisão. Em comunicado dimanado da sua Direcção, o F. C. Porto desacredita de todo a AFP, considerando-a «persona non grata». E nem sequer lhe reconhecendo legalidade. «Através da observação dos actos cometidos pela AFP, o quanto estava a infringir os regulamentos e reconhecendo ainda o Clube a ausência de garantias de que os seus direitos viessem a ser respeitados no futuro, acabara por decidir oficiar aquela Associação não a reconhecendo como legal e, desta maneira, interromper as relações com ela até à próxima Assembleia-geral». Contra-ataque da entidade associativa: suspensão pura e simples do F. C. Porto, que, assim, se veria privado da disputa do Campeonato Regional, cujo seria marcado, para além da ausência da sua principal equipa por cenas rocambolescas, acontecendo a mais risível e inacreditável no jogo da decisão do título, entre o Salgueiros e o Boavista (3-1), em que o árbitro João Diogo se apresentou equipado de botas altas e esporas.
No dia 13 de Abril de 1918, o F. C. Porto lançou o primeiro número do seu jornal, denominado «Porto Sportivo», destacando-se peça assinada por José Lello, vituperando os dirigentes associativos, deixando entender que o seu clube estava vitimado por um mundo semeado de rasteiras, reagindo e flagelando se preciso fosse como revolta do seu orgulho ferido. E lançando farpas em vários outros sentidos. «A suspensão do F. C. Porto tem preocupado mais certa gente estranha do que os próprios interessados. Entre esses figura o correspondente no Porto do nosso colega «Sport Lisboa» que, com tal questão tem enchido de prosa alheia a sua secção, dando descanso à prosa própria. Permita-se-nos que façamos já uma rectificação ao que naquele jornal vimos escrito. O F. C. Porto não promoveu a reunião da Assembleia-geral da Associação com o fim de protestar contra a sua suspensão. Nem de tal se falou na Assembleia, por parte deste clube. Apenas houve, por parte da Direcção da Associação, a exposição do que havia feito sobre este assunto e isto com o fim, segundo percebemos, de nos impingir a prosa do ofício que enviou ao F. C. Porto e que este não esteve para aturar. Agora é o correspondente do nosso colega que a impinge aos leitores. Havia ali lindas imagens como aquela dos espelhos e outras de natureza igualmente reflexa. Ora fique-se sabendo, de uma vez para sempre, que o F. C. Porto não pediu o levantamento da suspensão que lhe foi imposta, porque, suspenso ou não suspenso, nunca este clube jogará numa Associação em que a Assembleia afirma: «nem os clubes nem a Direcção da Associação são obrigados a cumprir os Regulamentos». Evidentemente teria o F. C. Porto toda a vantagem em transigir com a «desordem», com a «chicana». Porque as leis são exactamente a garantia dos mais fracos. E este clube, com a força que dispôs, com menos vergonha, com menos escrúpulos, facilmente faria passar para si a faca e o queijo que talharia a seu belo prazer. Mas isso seria a ruína do futebol já agonizante e de tal crime não seremos cúmplices.»
Lello, com revolta a repassar nas palavras escritas, denuncia: «Se a Associação não tivesse resolvido viver sem tos e regulamentos, dando aos cinco indivíduos que compõem a Direcção a força de fazerem aquilo que quiserem — e isso têm feito — a suspensão do F. C. Porto seria uma deliberação nula. Com efeito diz o art. 46º dos tos que nenhum clube poderá ser castigado sem que a Direcção da Associação lhe notifique qual a falta de que é acusado. E se no prazo de oito dias não obtiver resposta ou a resposta não for satisfatória, aplicará, então, a respectiva pena. Claro que a Direcção da Associação não fez nada disso. Bastava estar designado nos tos para que ela o deixasse de fazer. Devemos dizer em abono da justiça estarmos convencidos que a Direcção da Associação não cometeu esta infracção com intuitos propositados. Tantas infracções havia já cometido, que não iria voluntariamente buscar lenha para se queimar, tanto mais que não estava segura de que a Assembleia lhe reconhece a ilegalidade. Agora, sim, pode espinotear à vontade. Não foi, pois, propositado aquilo. Demais, dizem-nos que teve várias sessões preparatórias antes de dar o golpe. Estudou, buscou, rebuscou, leu estatutos, leu regulamentos... e no fim saiu asneira. Que querem? Está-lhe na massa do sangue...»

Os votos em si próprios de quatro «preclaros varões»

Mas Carlos Lello, de pena agreste, manteve o tom ao ataque aos dirigentes da AFP, transformados pelos portistas em «anjos negros», que era preciso arrear... «Na Assembleia-geral da Associação ultimamente realizada, foi rejeitada a proposta do delegado do F. C. Porto em que se mostrava a necessidade de serem cumpridos os regulamentos, por quatro votos de maioria. Foi, em seguida, aprovado um voto de confiança à Direcção pelos mesmos quatro votos. Ora estes votos são precisamente os dos membros da Direcção que estavam presentes e votaram. Aprovaram um voto de confiança em si próprio. Pudera! Há quem critique isto. Nós não. A confiança em si é uma das grandes condições da vida. E aqueles preclaros varões estão destinados a ser sempre vencedores. Damos-lhe daqui um conselho. Deixem falar os despeitados. Continuem votando em si, sempre que tenham ocasião. Ora calculem que não votavam em si, o trambolhão que apanhavam no outro dia? Lá se ia todo o arranjinho, todo o trabalho de uma época inteira. E assim ainda estão de poleiro. Continuem, continuem...»
O conflito apenas se sanaria de todo em Novembro. Após eleições para a AFP. Cujos novos dirigentes mereceram voto de confiança do F. C. Porto...
In «abola»
 

fcporto56

Tribuna Presidencial
26 Julho 2006
7,173
0
Sacramento
> hast Comentou:

> Vidal Pinheiro morto em combate.

Vidal Pinheiro era dos mais carismáticos futebolistas do F. C. Porto. Tombaria na batalha Flandres. Houve quem, na Constituição, chorasse de raiva...

Em 1917/18, o F. C. Porto perderia o título de campeão do Norte. Não tanto pela dificuldade de organizar equipas, já que alguns dos seus melhores futebolistas andavam por esses dias metidos, obviamente a contragosto, em mortíferos jogos de guerra, nos campos de batalha da I Grande Guerra, mas, sobretudo, por a Associação de Futebol do Porto ter suspendido de actividade o clube, em Março de 1918.
Mas, mais do que a perca do título, doeram outras percas, causadas por essas tenebrosas malhas que o destino tece.
A equipa de futebol estava amputada de alguns, gente de valor e carisma. Casos mais flagrantes, os dos ingleses, quase todos chamados para a tropa do seu país, mas também de vários outros, que não só do futebol. Floriano Pereira esteve à beira da tragédia. Livrou-se. Pior sorte teria o tenente Vidal Pinheiro, que pouco antes da partida ajudara à conquista definitiva da Taça José Monteiro da Costa, sendo, para além de grande futebolista, um dos melhores atletas do clube. Apesar de considerado, hoje, nos anais da História, como herói da Flandres, tombaria nas suas trincheiras, na terrível batalha de 9 de Abril de 1918.
A notícia da sua morte seria conhecida em Portugal em Maio. Os seus companheiros de equipa, ao despedirem-se do «bravo oficial do exército», que para tantas vitórias portistas contribuíra, prometeram ao capitão Vidal Pinheiro que à sua chegada como... herói, haveriam todos de dar grande festa em sua honra. O destino, implacável, frustrara a promessa. E quando no campo surgiu o jornal com a notícia fria, chocante, da sua morte, todos os que por cá ficaram, sofrendo também, verteram lágrimas de saudade e comoção. E nem o facto de ter «morrido ao serviço da Pátria» calou alguns desabafos de revolta. Pelo destino. E pelo que os homens (des) fazem por via das suas ambições ou das suas loucuras.

Os soldados que não se esquecem

O F. C. Porto, embora ferido pelas faltas inevitáveis, não se esqueceu dos seus soldados, dos seus oficiais. Nem dos que eram adversários. Nem dos desportistas aliados. Assim, na Assembleia-geral de 2 de Janeiro de 1918, em ambiente de sentida emoção, apresentou Ivo Lemos uma moção que os associados do FCP aprovaram por aclamação, propondo para além de «um voto de sentimento pela perda de todos os homens do desporto de qualquer nacionalidade que morreram nos campos de batalha» e que fosse «criado um quadro de honra que será colocado numa das dependências do clube e que deverá mencionar os nomes de todos os sócios que morram nos campos da batalha ou regressem inutilizados para o desporto, demonstrando por essa forma que o F. C. Porto não os olvida».
Ninguém imaginaria, contudo, que Vidal Pinheiro, cujo carisma se acastelara já em torno de todos os portistas, pela sua postura de homem galhardo e desportista imaculado, cairia, algumas semanas depois, fulminado pela metralha alemã. Como tantos outros. Estupidamente.
In «abola»

..................................
O campo Vidal Pinheiro do Salgueiros foi nomeado em honra e em memoria deste mesmo Vidal Pinheiro?
 
H

hast

Guest
Eu penso que não, fcporto56. O «nosso» Vidal Pinheiro seria muito jovem quando morreu em França, deveria ter entre 18 e vinte anos, digo eu. O outro Vidal Pinheiro, o engenheiro, com certeza que seria mais entrado na idade, o que seria mais lógico para que o nome fosse perpetuado no campo do Salgueiral. De qualquer maneira, já andei pesquisar e não encontrei nada. Se alguém souber, faça o favor de postar.
 
H

hast

Guest
Primeira vitória em grande torneio.

Em 1919, enfim, a alegria de ganhar. Sem ser moralmente. Num torneio com o Benfica e o Sporting, que renderia... 750$35. Por isso, o tesoureiro e os jogadores exultaram.

A organização de um torneio de futebol tinha custos elevados. Por exemplo, a banda de música poderia cobrar oito escudos para «abrilhantar o espectáculo». Os anúncios nos jornais custariam quatro escudos. Por cada jogo e cada lanche, no tempo em que o vinho e as sanduíches tinham sido já substituídos pelas cervejas, os chás e os bolos, não custaria, nunca, menos de 10$500. A hospedagem em hotel, de cada equipa, não ficaria por menos de 62$970, o troféu e as medalhas por menos de 7$300, o pagamento à Guarda por menos de 30$950 e aos porteiros e bilheteiros por 34$500. Assim, apesar dos riscos, o F. C. Porto abalançou-se à organização, nos dias 30 de Novembro e 1 de Dezembro de 1919, de um «grande torneio» de futebol, no Campo da Constituição, com a presença do Espinho, do Sporting e do Benfica. Valeu a pena o sacrifício. À compita com as duas melhores equipas nacionais, os portistas logravam, assim, a sua primeira vitória num «grande torneio» de futebol, com concorrentes de outras áreas.
O Sporting estadeava o título de campeão de Lisboa. E nunca perdera com o F. C. Porto. O primeiro desaire aconteceria, precisamente, a 30 de Novembro. Facilitado, segundo cronista de então, por qualquer arrepio de arrogância que talvez tenha entorpecido os seus jogadores. «O Sporting não se apresentou na sua máxima força, por prever que isso não seria necessário. Enganou-se, porém, porque foi vencido pelo F. C. Porto, por 2-1. Este resultado causou, como se compreende, grande entusiasmo entre os portuenses. Na primeira parte, o Sporting exerceu certo domínio, mas com falta de remate. O \'keeper\' do F. C. Porto (António Lino) defendeu algumas bolas difíceis, tendo também os backs boas intervenções. No ataque, os portuenses mostraram-se fracos. Rei salientou-se na marcação dos \'goals\'...»
O F. C. Porto alinhou com António Lino; Magalhães Bastos, Ferreira da Silva, Adelino Costa, Couteiro, Aires Pereira, Camilo Moniz, Carlos Pires, Cardoso, Joaquim Reis e João Sampaio. E o Sporting contou com Quintela; Assis Pereira, Jorge Vieira, João Francisco, Caetano, Boaventura, Rebelo, Jaime, Francisco Stromp, Miranda e Marcelino.
Na partida seguinte, o Sporting, mais empolgado, mais arrebatado, bateria (4-1) o Benfica, que alinhara com Guerra; Pinho, Bastos, Jesus, Gonçalves, Cândido de Oliveira, Ribeiro dos Reis, Herculano, A. Augusto, Crespo e Alberto Augusto. Foi jogo de insólitos. «Na primeira parte, o Sporting dominou mais, marcando três goals... Numa carga sobre o Benfica, a bola, batendo nas balizas, derrubou-as, tendo de proceder-se ao seu conserto, pelo que o jogo esteve interrompido algum tempo.» Outro: «Numa colisão entre Cândido de Oliveira e Francisco Stromp, este cai e Cândido vai socorrê-lo, bem como outros jogadores, mas o árbitro, impassível, não interrompe o jogo, apesar de chamada a sua atenção pelo público... e a bola entra nas redes do Benfica.»
A talho de foice, comentário de um jornalista do Porto em remoque ao modo de ver futebol em... Lisboa: «O árbitro, Luciano Simões, foi pateado e aplaudido ao mesmo tempo. Ora, já na primeira parte do desafio ele apitara quatro minutos antes do período regulamentar, com a agravante de não ter descontado o tempo gasto no conserto das balizas. Interrogado, o árbitro, acerca deste procedimento, declarou que tinha procedido assim porque quis e por causa do público. Porque quis? Por causa do público? Ainda se fosse para que este não estivesse mais tempo à chuva!... O público manifestou-se, por vezes, ruidosamente, como é costume em Lisboa... Basta dizer isto... O Sporting foi muito ovacionado e o seu capitão Stromp levado em triunfo.»
E, por via do desfecho, o F. C. Porto nem precisou de jogar com o Espinho para ser declarado vencedor. A ajuda não estimulava, o jogo não se fez e «à noite realizou-se um banquete oferecido aos clubes de Lisboa». Para esse banquete gastaram-se, só em champanhe, 9$47. Que a façanha merecia festa de arromba. Merecia.
Outro motivo se entreviu, entretanto, para festejar. As receitas do torneio ascenderam a 1716$75, quedando-se as despesas pelos 1640$90, pelo que o F. C. Porto lucrou com a iniciativa 750$35. Nunca o clube ganhara tanto dinheiro. Como termo de comparação, refira-se que o transporte das equipas do Benfica e do Sporting custara 101$790 cada.
In «abola»
 
H

hast

Guest
«E, por via do desfecho, o F. C. Porto nem precisou de jogar com o Espinho para ser declarado vencedor. A ajuda não estimulava, o jogo não se fez e «à noite realizou-se um banquete oferecido aos clubes de Lisboa». Para esse banquete gastaram-se, só em champanhe, 9$47. Que a façanha merecia festa de arromba».

-------------------

Como são diferentes os tempos de hoje. Cenas destas só poderiam acontecer há quase 100 anos atrás.
 
H

hast

Guest
Ganhar ao Benfica e sofrer o silêncio

Em 1920, a primeira vitória sobre o Benfica. Por 3-2. Em Sete Rios. Abespinharam-se os dirigentes portistas ao ver que os jornais de Lisboa tinham abafado a proeza!

A 14 de Março de 1920, o Vitória de Setúbal, então um dos melhores conjuntos de Portugal, de tal modo que despojara o Benfica do título de Lisboa, batendo-o em jogo polemíssimo, para euforia dos sportinguistas, jogou na Constituição. Ganhou por 2-1 e, no dia seguinte, em «O Primeiro de Janeiro», escrevia-se: «Não podia ser mais lisonjeiro o resultado. Os portuenses perderam apenas por 2-1 e o F. C. Porto pôde mostrar, sem favor, o seu formidável ardor combativo que galhardamente resistiu aos não menos formidáveis ataques dos setubalenses. O desafio foi, em parte, prejudicado por dois fortes aguaceiros. Houve quem nos dissesse que era uma exorbitância pedir 5 tostões para assistir a um desafio e ter depois de aguentar com duas cargas de água. Há que reconhecer-lhe uma pontinha de razão. O público, que era numeroso, conduziu-se menos-mal. Mas há ainda uns impertinentes que precisam de dominar os nervos e... a língua. A arbitragem de Américo Pacheco foi infeliz. Deixando passar algumas faltas, tanto bastou para que o público se insurgisse por vezes contra uma suposta benevolência para com os visitantes que, digamo-lo de passagem, são correctos e leais.»
O F. C. Porto perdeu no campo e na bilheteira. Arrecadou uma receita de 486$39 que não compensou as despesas (fundamentalmente de deslocação e estada dos setubalenses), que ascenderam a 615$33. Mas os portistas ganharam nova alma. E mais quente ficou a esperança de que os sulistas pudessem, enfim, ceder...
...Não seria preciso esperar muito. A 4 de Abril de 1920, outra tarde histórica, em Sete Rios, em Lisboa. O F. C. Porto conseguiu, enfim, bater o Benfica. Por 3-2. Na edição do dia seguinte de «Os Sports» exalta-se a «enchente colossal» e acentua-se que os portistas venceram «com superioridade». O F. C. Porto esteve a ganhar por 3-0, com golos de Alexandre Cal e Joaquim Reis. O Benfica reduziria para 1-3, mas, antes do segundo golo, os portistas perderam duas grandes penalidades. «Uma foi enviada às mãos do guarda-redes do Benfica. Outra passou ao lado da baliza.»
Nessa exibição do F. C. Porto, apareceu pela primeira vez na sua equipa o admirável Norman Hall, tendo-se salientado, também, Lino Moreira, Ferreira da Silva, Floriano Pereira, Joaquim Reis, Alexandre Cal e José Ferreira.

O silêncio dos jornais de Lisboa

Em tom épico, escrevia-se em «O Primeiro de Janeiro»: «O nosso campeão venceu o fortíssimo agrupamento da capital por 3-2. É um resultado que deve animar extremamente os nossos amadores de futebol, amigos da sua terra. O que é estranhável, e até certo ponto digno de censura, é o facto de nenhum dos jornais de Lisboa se referir a este encontro, noticiando o seu resultado, quando é certo que, quando os portuenses perdem, a imprensa local está sempre pronta a fazê-lo. A verdade, porém, é que desta vez e em campo estranho, o F. C. Porto conseguiu vencer o Benfica numa luta renhida e interessante na qual foi necessário empenhar todos os esforços e energias. O Benfica apresentou-se com o seu melhor núcleo de jogadores, o que torna a vitória do F. C. Porto duplamente honrosa. Esse resultado foi de 3-2, sendo os golos do Benfica marcados de ‘penalty’. Salientaram-se, por parte do F. C. Porto, o keeper Lino, o half Floriano e os forwards Alexandre Cal e Norman Hall. A assistência, que era numerosa, reconheceu o valor da equipa portuense e manifestou-lhe, por vezes, a sua simpatia.»
Alguns dias antes, outro jogo com lisboetas e nova vitória, na Constituição. Vítima: o Império. 4-1. Exultando com a desfeita de «um grupo que dispõe de elevados recursos, tanto assim que defrontando-se, por duas vezes na semana passada com o formidável Benfica, conseguiu levá-lo de vencida no primeiro desafio e empatou no segundo», o cronista sugeria que, a partir de então, ao F. C. Porto só faltava «mandar cortar a erva, demasiadamente grande que se encontra ao lado norte do seu campo (da Constituição) e que muito dificulta o andamento da bola».

Os segredos desvendados do abandono de campo

A partida rendeu uma receita de bilheteira de 649$70, mas, porque as despesas foram de 615$33 (iguaizinhas às do jogo com o Vitória de Setúbal) o jogo deu um prejuízo de 287$03. Mas mais dolorosas foram, para os responsáveis portistas, algumas omissões. E como só não se sente quem não é filho de boa gente, Alexandre Cal, capitão-geral do F. C. Porto, publicou em «O Primeiro de Janeiro» de 17 de Março de 1920 uma carta sintomática — que era, sobretudo, um grito de revolta, com revelações insólitas e impressionantes, indícios claros de uma guerra Norte-Sul que já nem sequer estava latente, existia e arrebatava: «Quero frisar que os jogadores do F. C. Porto não só se portaram de uma maneira brilhante em ambos os desafios (contra o Império e contra o Benfica), como foram também extremamente correctos para com os seus adversários e para com o público, não tendo abandonado o campo de jogo no decorrer da segunda parte do primeiro desafio por uma vontade, mas sim porque o público se manifestou ruidosamente e invadiu o campo, não consentindo a continuação do jogo (contra o Império). Eu não viria de modo algum falar nesta assunto se a ‘Imprensa Desportiva’ da Capital pusesse um pouco de parte o seu facciosismo e fizesse com imparcialidade e lealdade o relato de ambos os desafios. Mas assim não procedeu e os jornais que têm a sua ‘secção desportiva e que pelo menos costumam anunciar aos seus leitores os resultados dos desafios, deixando desta vez de o fazer, excepto um que falou do resultado do primeiro desafio, mas que não disse a expressão da verdade. Com efeito, o F. C. Porto não perdeu com o Império, como esse jornal publicou; se tivesse contado os factos como eles se passaram, deveria ter dito que o jogo entre o F. C. Porto e o Império não chegou a terminar porque o público, indignado, principalmente com a arbitragem, protestou ruidosamente, incitando os jogadores a abandonar o campo, sendo este logo a seguir invadido pela assistência, não consentindo que o jogo continuasse e aclamando com entusiasmo os jogadores portuenses, sendo até o guarda-redes levado ao colo pela multidão e delirantemente ovacionado. Esta é que é a pura verdade: o F. C. Porto não perdeu com o Império.
O segundo desafio, jogado contra o Benfica, foi ganho pelo F. C. Porto, por 3--2. Este resultado não veio em nenhum jornal dos que mantém ‘secção desportiva. A razão deste silêncio? É simples: Lisboa, em futebol, há dez anos ou mais que estava habituado a vencer o Porto, conseguindo quase sempre mais ou menos fáceis vitórias. Este ano, o Porto quis vencer e venceu, e para isso trabalhou com vontade, desfazendo assim a ideia que muitos tinham de ser impossível tão cedo o Norte triunfar do Sul. Eis a razão por que foi tão pouco falada a vitória dos portuenses.
Quanto aos jornais desportivos, um deles, que por sinal costuma trazer uma resenha bastante desenvolvida dos bons desafios, limita-se a fazer uma pequena apreciação que por acaso não condiz nada com o título, e essa mesma feita em tipo pequeno, como que a ver se passava despercebida. Inclusivamente, em lugar de dizer, ‘o F. C. Porto venceu o Benfica’, diz ‘team do Porto vence o Benfica’. Faço esta pequena observação, que poderia parecer sem importância, mas é para que todos fiquem sabendo que o grupo que foi a Lisboa é única e exclusivamente de elementos do F. C. Porto e não com alguns do Oporto Cricket Club, como um jornal desportivo da capital fez constar, talvez por más informações.»
In «abola»
 
H

hast

Guest
Já em 1920 o desprezo por parte da imprensa lisboeta se fazia sentir. Não havia o Record, a Bola e outras porcarias que tais, mas o que existia na altura fez boa escola. As sementes germinaram e o resultado é o que todos nós sabemos.